Os ministros do STF, Edson Fachin e Rosa Weber durante julgamento em Plenário.| Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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Está nas mãos do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, a possibilidade de marcar a data para que o plenário da corte enterre de vez uma aberração criada pelo próprio Toffoli: o inquérito ilegal e abusivo instaurado dentro do âmbito do STF para apurar supostas fake news. O instrumento já foi usado para retirar do ar conteúdos publicados pela revista Crusoé e pelo portal O Antagonista, há um mês, além de motivar ações de busca e apreensão nos endereços de pessoas que criticaram membros da corte pelas mídias sociais. Se o arbítrio cometido contra as duas publicações foi revogado em poucos dias, o inquérito que lhe deu origem continua a existir, com relatoria do ministro Alexandre de Moraes – e, pior ainda, tramitando sob sigilo. A Rede Sustentabilidade recorreu ao Supremo para derrubar o inquérito; o relator do pedido, ministro Edson Fachin, decidiu que a análise do caso cabe ao plenário da corte e pediu que Toffoli marque uma data para o julgamento.

Do ponto de vista jurídico-processual, não haveria impedimento nenhum para que Fachin suspendesse liminarmente o inquérito

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Fachin, é bem verdade, teria bons motivos se quisesse, monocraticamente, suspender o inquérito de forma liminar até que o plenário decidisse de forma definitiva o destino das investigações. O inquérito é uma monstruosidade jurídica em que o Supremo assumiu o papel de vítima, investigador e julgador. As investigações foram iniciadas sem que tivesse havido provocação do Ministério Público Federal ou de autoridade policial – o MPF, aliás, por manifestação da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu o arquivamento do inquérito, fazendo diversas críticas ao procedimento de Dias Toffoli. O pedido, no entanto, foi simplesmente ignorado por Alexandre de Moraes, escolhido relator do inquérito pelo presidente do STF, e não pelo tradicional sistema de sorteio eletrônico entre os membros da corte. Para completar, o inquérito foi instaurado sem que houvesse um fato específico a motivá-lo, o que também viola a ordem legal; e, sem que ninguém fosse formalmente acusado, nem haveria como determinar se o STF seria realmente o foro adequado para julgar os eventuais acusados.

Se do ponto de vista jurídico-processual não haveria impedimento nenhum para que Fachin suspendesse liminarmente o inquérito, por outro lado pode-se argumentar que remeter o caso diretamente ao plenário é uma forma prudente de lidar com a situação. Haveria, por exemplo, a possibilidade de Toffoli aprofundar a crise causada por ele mesmo caso decidisse reverter, também monocraticamente, a decisão do colega, como tem ocorrido em outras ocasiões envolvendo assuntos diversos. Evidentemente, se fizesse algo assim, insistindo na manutenção das investigações, o presidente do Supremo deixaria ainda mais clara sua posição em favor do abuso, mas a esta altura é de se questionar se ele ainda teria algo a perder agindo desta forma.

Nossas convicções: Liberdade de expressão

Leia também: Danilo Gentili: o justo limiar entre honra e liberdade de expressão (editorial de 13 de abril de 2019)

O mínimo que o presidente da corte pode fazer, agora, é marcar rapidamente uma data – e o quanto antes, melhor – para que os 11 ministros deixem muito claro se estão do lado da arbitrariedade ou do respeito às liberdades democráticas, ao devido processo legal, ao direito à crítica e à liberdade de crônica, especialmente agredida no caso da punição imposta à Crusoé e a O Antagonista. Eventuais crimes cometidos contra ministros do Supremo – aí incluídos os crimes contra a honra – podem e devem ser apurados, mas sempre dentro do marco legal, e jamais por meio de um inquérito criado de forma intencionalmente ampla e nada específica, para poder abarcar até mesmo críticas amparadas por direitos garantidos constitucionalmente.

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Como já lembramos neste espaço, se o STF se transformou em alvo de fortes críticas da sociedade civil – algumas das quais podem até ser exageradas ou infundadas, como também reconhecemos, mas legítimas em um país democrático –, isso ocorre porque há ministros que insistem em ignorar seu papel dentro do sistema republicano, seja arvorando-se constantemente em legisladores, seja arrogando-se prerrogativas ou “falsos direitos” que os colocam acima dos demais cidadãos naquilo em que a Constituição nos iguala a todos. A perseguição criada por Toffoli e conduzida por Moraes no inquérito das fake news é uma reação que apenas dá mais argumentos aos críticos do Supremo. Um absurdo a que os demais membros da corte precisam dar fim.