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Editorial

O (não) esforço de Lula pela paz na Ucrânia

Presidente viajou para a cúpula do G7 no Japão (Foto: EFE/EPA/JAPAN POOL)

Desde que assumiu seu terceiro mandato na Presidência da República, Lula vem tentando convencer o mundo de que pode assumir a função de paladino da paz na Ucrânia. Segundo apregoa o petista aos quatro ventos, bastaria uma “boa conversa” para colocar fim aos desvarios expansionistas de Vladimir Putin e também à resistência ucraniana – pois, para Lula, é preciso lembrar, a Ucrânia faz mal em insistir em se defender da agressão sofrida, pois, assim, “prolonga” a guerra. Mas para quem insiste tanto no valor do diálogo como forma de se chegar à paz, Lula se esforça muito pouco para conversar abertamente com aquele que é um dos principais interessados no fim da guerra: Volodymyr Zelensky, que há mais de um ano vê seu país ser destroçado pelas forças russas.

Participando do encontro do G7 como convidado – assim como os líderes da Austrália, Índia, Coreia do Sul, Vietnã, Indonésia, Comores (representando a União Africana) e Ilhas Cook (representando o Fórum das Ilhas do Pacífico) –, Lula não aproveitou a oportunidade para conversar com o presidente ucraniano, que também estava presente na cúpula. O próprio Zelensky havia manifestado o desejo de falar com o brasileiro, mas o encontro não aconteceu. Oficialmente, os motivos alegados foram “desencontros da agenda”, mas parecem ser efeito direto da falta de vontade.

A diplomacia brasileira liderada por Lula caminha a passos largos para ser cada vez mais irrelevante.

Em entrevista após o fim da cúpula, Lula chegou a dizer que reservou um horário na agenda para receber o ucraniano, mas Zelensky simplesmente não apareceu. Segundo o petista, a reunião bilateral com a Ucrânia estaria agendada para 15h15 (horário do Japão) do último domingo (21). Mas, estranhamente, na agenda oficial do presidente há outro compromisso para o mesmo horário, uma reunião com o primeiro-ministro da República Socialista do Vietnã, Pham Minh Chinh, e nenhuma menção a Zelensky. Na sequência, às 16h15, Lula se reuniu com o presidente da União das Comores, Azali Assoumani.

O próprio Lula mencionou a agenda com o vietnamita: “Nós esperamos e ficamos recebendo a informação de que eles [Zelensky] tinham atrasado. Enquanto isso, atendi o presidente do Vietnã. E quando o presidente do Vietnã foi embora, o presidente da Ucrânia não apareceu. Certamente teve outros compromissos e não pôde vir aqui. Foi, infelizmente, isso que aconteceu”, disse Lula em entrevista coletiva. Ele afirmou ter ficado “chateado”, mas não explicou – e nem foi questionado – sobre os motivos de marcar para o mesmo horário duas agendas completamente distintas.

Em resumo, ou Lula simplesmente mentiu sobre o agendamento, ou queria receber Zelensky extraoficialmente e, neste caso, se o ucraniano tivesse aparecido, o encontro teria de ser brevíssimo, entre os demais os compromissos oficiais do petista. Na lacuna deixada por Lula, Zelensky aproveitou para falar com outros emergentes, como a Índia, que mantém fortes laços comerciais com a Rússia – os russos são os principais fornecedores de suprimento militar para os indianos. O primeiro ministro do país, Narendra Modi, diferente do petista, conseguiu encontrar tempo na agenda para receber o presidente ucraniano e se mostrou bastante efusivo ao cumprimentá-lo.

Além desse “desencontro” de agendas no domingo, um dia antes, tanto Lula quanto o presidente ucraniano participaram da mesma sessão de discussões no G7 e o brasileiro poderia ter ao menos tentado cumprimentar o presidente da Ucrânia, o que não aconteceu. Nas imagens do evento, é possível ver Zelensky sendo cercado e cumprimentado por vários líderes mundiais, enquanto Lula permanece sentado. O brasileiro não dirige nem mesmo um olhar para o ucraniano, coisa bem estranha para quem quer ser um negociador da paz.

O discurso oficial do brasileiro igualmente não contribuiu em nada para o fortalecimento da imagem de um negociador da paz. Mesmo que seu foco principal não fosse a guerra na Ucrânia – Lula aproveitou a participação do G7 mais para criticar o FMI e pedir “compreensão” com a dívida argentina do que para defender os interesses brasileiros –, o petista reafirmou as críticas aos EUA e nações ocidentais por continuarem a apoiar a resistência ucraniana, declarando que repudia "veementemente o uso da força como meio de resolver disputas”. O único aceno ao bom senso de Lula foi citar a violação da soberania ucraniana pela Rússia.

Levando-se em conta o histórico de declarações estapafúrdias do petista em relação à Guerra na Ucrânia, ter admitido que a Rússia atacou a soberania ucraniana é um avanço. Lula já acusou Zelensky de ter responsabilidade igual à de Putin no conflito, criticou os esforços dos países ocidentais em oferecer ajuda para a resistência ucraniana, sugeriu que o país invadido se rendesse aos russos e reclamou que a Ucrânia insista em manter seu território original. Em contrapartida, Lula manifesta predileção pelo presidente Vladimir Putin, com quem se apressou em estreitar relações. No final de março, o presidente brasileiro fez questão de enviar Celso Amorim em visita de seis dias à Rússia; em 17 de abril recebeu Sergei Lavrov, principal representante no presidente russo. Uma visita diplomática de Celso Amorim à Ucrânia só foi feita em 9 de maio, numa tentativa de amenizar os desastrosos efeitos do evidente alinhamento do governo brasileiro ao discurso russo.

Esse alinhamento é mais do que evidente entre os próprios atores diplomáticos. Aos poucos, líderes e setores que antes demonstravam entusiasmo com a eleição de Lula e suas proposições de paz, começam a ver a realidade: o Lulinha Paz Mundial, pacificador do mundo, é só mais uma face falastrona do velho Lula aliado de ditadores. A ideia de que a diplomacia lulista é pautada pelo propósito de manter abertura com todas as nações – incluindo as que cometem graves violações como a Rússia ou Nicarágua – não convence mais, nem aos brasileiros, nem à comunidade internacional. Infelizmente, a diplomacia brasileira liderada por Lula caminha a passos largos para ser cada vez mais irrelevante.

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