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Editorial

O novo corte da Selic e o “risco Lula”

Edifício-sede do Banco Central em Brasília: apesar de queda na Selic, Brasil ainda tem o maior juro real do mundo. (Foto: Leonardo Sá/Agência Senado)

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Como já se esperava, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central promoveu, na reunião encerrada na quarta-feira, a terceira redução seguida de meio ponto porcentual na taxa Selic, que agora passa a ser de 12,25% ao ano. No entanto, mais importante que o corte em si e que a antecipação de uma “redução de mesma magnitude nas próximas reuniões” é uma frase que aparece no meio do comunicado divulgado no fim da tarde do dia 1.º. “Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reafirma a importância da firme persecução dessas metas”, afirmam os membros do Copom.

A exortação não é nenhuma novidade: aparece com as mesmíssimas palavras no comunicado da reunião de setembro. O que mudou nos últimos 45 dias foi a postura do governo Lula, que retomou sua guerra contra as metas econômicas. No início do ano, o alvo era a meta de inflação, que o petista considerava austera demais, embora não tivesse nada de absurda; no fim, ela acabou mantida pelo Conselho Monetário Nacional, no qual o governo tem a maioria. Agora, a artilharia verbal de Lula se dirigiu à meta de zerar o déficit primário em 2024 – objetivo este que foi estabelecido pelo próprio governo, autor da proposta de arcabouço fiscal aprovada pelo Congresso Nacional. “A gente não precisa disso [zerar o déficit primário em 2024] (...) Eu não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo um corte de bilhões nas obras”, disse o presidente da República em café da manhã com jornalistas no fim de outubro.

Desprezo de Lula pela meta fiscal do ano que vem pode aumentar expectativa de inflação, ameaçando o ciclo de afrouxamento monetário promovido pelo Copom

Evidentemente, os membros do Copom não são ingênuos e estão conscientes de que a meta de zerar o déficit em 2024 tem pouquíssima chance de ser cumprida. No entanto, há uma enorme diferença entre acabar descumprindo a meta mesmo tendo se esforçado para atingi-la e descumprir a meta porque ela foi simplesmente abandonada. Como o descontrole do gasto público está diretamente associado à inflação, uma eventual constatação de que o governo nem mesmo fará um esforço para se manter próximo à meta que ele mesmo traçou inverterá a trajetória de “ancoragem de expectativas”. Se antes o mercado financeiro estava demonstrando mais confiança na possibilidade de a inflação convergir para a meta, ou ao menos ficar dentro do limite superior de tolerância, as declarações de Lula têm tudo para reverter essa tendência. E sem ancoragem de expectativas não há como continuar o processo de afrouxamento monetário, alerta o Copom.

O papel exercido por essa confiança já tinha sido ressaltado pelo comitê na reunião de agosto, quando o comunicado tratou da “queda das expectativas de inflação para prazos mais longos, após decisão recente do Conselho Monetário Nacional sobre a meta para a inflação”, o que permitiu “acumular a confiança necessária para iniciar um ciclo gradual de flexibilização monetária”. É exatamente isso que começa a faltar agora, graças a Lula e, mais recentemente, também a seu ministro da Fazenda, cujo destempero na entrevista coletiva concedida na última segunda-feira evidenciou sua falta de respaldo por parte do presidente da República. Questionado sobre a meta fiscal, tergiversou, afirmou que “a minha meta está mantida” e abandonou a coletiva quando uma jornalista insistiu sobre o assunto: afinal, a meta de Fernando Haddad é a mesma de Lula ou do governo?

O Copom adiantou a possibilidade de cortar a Selic em meio ponto porcentual na próxima reunião, em dezembro, mas impôs uma condição: nova redução só ocorrerá “em se confirmando o cenário esperado”. O “cenário” envolve uma série de variáveis e indicadores, mas também inclui a confiança do investidor na saúde fiscal do país. E o que o Copom espera é o que está no comunicado: “firme persecução” das “metas fiscais já estabelecidas”. O descaso de Lula em relação à meta vai na direção contrária, e coloca em risco a sequência de reduções da Selic.

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