Enquanto o relator da reforma da Previdência na Comissão Especial da Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), decide se mantém estados e municípios no projeto ou se os retira, o governo Jair Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional na terça-feira, dia 4, um projeto de lei complementar que trata de uma ajuda a estados em apuro fiscal. O texto, formalmente denominado Plano de Equilíbrio Fiscal (PEF), já ficou conhecido como Plano Mansueto, em referência a Mansueto Almeida, secretário do Tesouro Nacional, e exigirá dos estados que realizem operações de ajuste para que possam ter acesso a novas operações de crédito garantidas pelo Tesouro.
O projeto estipula uma lista de oito medidas, das quais os estados interessados em aderir – e também os municípios, mas apenas a partir de 2021, quando começam novos mandatos de prefeitos – terão de realizar pelo menos três. Elas incluem programas de privatizações e concessões (por exemplo, na área de saneamento básico), redução de benefícios fiscais já existentes e proibição de adotar novas medidas similares, a implantação de um teto de gastos semelhante ao que vale para o governo federal, e reformas contábeis para melhorar a gestão financeira.
Os estados continuam sua farra fiscal contando que, mais cedo ou mais tarde, o governo federal virá em seu socorro
Planos como o PEF não são novidade; há um bom tempo o governo federal vem tentando encontrar meios de socorrer os estados, especialmente aqueles cujos governantes conseguiram a proeza de ser mais irresponsáveis que os criadores e executores da “nova matriz econômica” que levou o Brasil à pior recessão de sua história. Estados importantes, como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, promoveram o caos fiscal a ponto de causar o colapso da prestação de serviços básicos e adiar por vários meses o pagamento de seus servidores – que, é preciso dizer, muitas vezes partiram para a estratégia suicida de tentar bloquear no grito as mesmíssimas medidas que ajudariam a sanear as contas de seus empregadores.
Mas a percepção que levou o governo federal a montar o PEF, no entanto, pode antecipar o resultado deste novo socorro. Segundo a equipe econômica, os planos anteriores, que costumavam envolver renegociação de dívidas dos estados com a União, não ajudaram a resolver o problema dos estados. Não por falta de boa vontade do Planalto, mas por falta de iniciativa dos governos estaduais, que manifestavam interesse na prorrogação dos prazos, mas não colocavam em prática as medidas de ajuste fiscal exigidas como contrapartida.
O Rio de Janeiro, por exemplo, continua discutindo se privatizará a Cedae, sua empresa de água e saneamento básico. A medida era uma das exigências do governo federal para que o Rio aderisse ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), instituído em 2017. A venda chegou a ser aprovada pelo Legislativo estadual, que reverteu a decisão logo depois. O governador Wilson Witzel (PSC), antes contrário à privatização, agora promete se desfazer de todas as empresas estaduais. Não foi à toa que o Tesouro Nacional tenha sido extremamente parcimonioso ao contemplar novas adesões – apenas a do Rio Grande do Sul está em estudo, enquanto outros estados foram rejeitados.
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Os estados também têm sido muito lenientes com um dos buracos sem fundo das contas públicas: os gastos com funcionalismo. Apesar da recessão, os governos estaduais continuaram a aumentar gastos com seus quadros de ativos e inativos, contratando e oferecendo reajustes incompatíveis com sua capacidade de pagamento. Um relatório do Tesouro Nacional, preparado em novembro de 2018, ainda no fim do governo de Michel Temer, mostra em detalhe como cada estado cavou seu fosso fiscal.
O mesmo relatório menciona a existência de um “risco moral” em que os estados continuam sua farra fiscal contando que, mais cedo ou mais tarde, o governo federal virá em seu socorro, e por isso sugere que a União adote e mantenha com firmeza uma política de “não salvamento” dos estados. O Plano Mansueto tem, a seu favor, a estratégia de exigir o cumprimento das medidas de ajuste fiscal antes que a União aprove o aumento da capacidade de crédito, ou seja: os governadores terão de mostrar serviço, em vez de fazer apenas compromissos que acabam não cumprindo. Que essa mudança ajude o PEF a conseguir sucesso onde seus antecessores falharam.