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Editorial

O pacote norte-americano contra os efeitos do coronavírus

Donald Trump pretende que os Estados Unidos estejam "reabertos" na Páscoa, em meados de abril. (Foto: AFP)

O poder de fogo norte-americano foi colocado em potência máxima contra os efeitos econômicos da pandemia de coronavírus nos Estados Unidos – no caso, o poder de fogo financeiro. Os partidos Republicano (do presidente Donald Trump) e Democrata (de oposição) concordaram em aprovar um pacote de estímulo recorde, de US$ 2 trilhões. Que tanto dinheiro assim seja necessário em uma economia que vinha em crescimento contínuo, exibindo taxas baixíssimas de desemprego, é prova do estrago feito pela pandemia: quase metade dos 50 estados norte-americanos adotaram medidas severas de restrição, com o fechamento dos negócios considerados não essenciais, ou recomendaram o autoisolamento, ainda que sem impô-lo legalmente. Nesta quinta-feira ocorre a divulgação dos dados de desemprego, e já se dá como certo que o resultado semanal (o número de vagas perdidas em um período de sete dias) será o pior de toda a história do país.

Cerca de um quarto do valor total, US$ 500 bilhões, irá para um fundo destinado a indústrias, cidades e estados; US$ 367 bilhões serão destinados a empréstimos para pequenas e médias empresas, com direito a juro zero e anistias proporcionais à força de trabalho mantida; US$ 130 bilhões irão para hospitais; US$ 150 bilhões abastecerão fundos estaduais e locais de estímulo; US$ 32 bilhões ajudarão empresas aéreas. Haverá, ainda, reforço no seguro-desemprego e pagamentos diretos a cidadãos: US$ 1,2 mil para americanos solteiros, US$ 2,4 mil para casais e US$ 500 para cada filho de até 17 anos – quem tiver rendimento individual bruto anual acima de US$ 75 mil receberá uma parte desse valor, e quem ganha acima de US$ 99 mil por ano não terá direito ao benefício. Por fim, o plano ainda suspende os pagamentos do financiamento estudantil e estabelece regras para proteger inquilinos e aqueles que hipotecaram suas casas.

Que tanto dinheiro assim seja necessário em uma economia que vinha em crescimento contínuo é prova do estrago feito pela pandemia

Assim como o Brasil, os Estados Unidos também vivem o dilema mortal entre o isolamento para conter a disseminação do vírus e o caos econômico que quebrará empresas e fará milhões de novos desempregados, punindo especialmente os mais pobres. O país registra cerca de 64 mil casos e ruma para superar mil mortes. Hospitais em Nova York, estado que concentra metade dos casos norte-americanos, já registram superlotação e falta de equipamento para os pacientes em estado mais grave. O epidemiologista Ira Longini, que assessora o Centro para Controle de Doenças (CDC, na sigla em inglês), estima que o pico de mortes ainda está por vir e será atingido em três semanas.

A previsão coloca os momentos mais graves do surto norte-americano em perto da Páscoa – justamente a data que Trump escolheu como marco para que o país esteja “reaberto”. Sua declaração foi recebida com preocupação mesmo entre colegas republicanos diante da possibilidade, levantada pela Organização Mundial da Saúde, de que os Estados Unidos tomem o lugar da Itália como o “epicentro” mundial da pandemia de Covid-19. O presidente ressaltou, no entanto, que só dará esse passo se ele for viável, e disse que está atento às recomendações dos principais especialistas médicos da força-tarefa do governo americano para o coronavírus, Anthony Fauci e Deborah Birx.

A recessão é inevitável; o banco Morgan Stanley prevê, para o segundo trimestre de 2020, um tombo de 30% na comparação com o mesmo período do ano passado. A injeção maciça de dólares na economia pode ajudar empresas a não quebrarem mesmo paralisadas, e manter um mínimo de renda para os norte-americanos que forem diretamente atingidos pelas demissões. O mesmo ocorre na Europa, onde países como o Reino Unido aprovam planos para bancar parte significativa dos salários de funcionários que correm risco de demissão, e a Alemanha lança um pacote de 700 bilhões de euros para salvar empresas e empregos. Diante de uma calamidade como a do coronavírus, mesmo grandes defensores da austeridade fiscal concluíram que ela pode esperar.

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