Há, entre outras, duas questões de alta relevância no debate econômico mundial. Uma busca responder se há ou não lógica em o setor público fazer dívidas. Se a resposta for “sim”, resta saber quando, como e em que volume faz sentido o endividamento do governo. Embora não haja consenso, sobretudo quanto à magnitude dos números considerados razoáveis, aceita-se que o setor público possa se endividar, mas em circunstâncias definidas e tecnicamente lógicas.
O governo nos três níveis – municípios, estados e União – arrecada dinheiro em forma de tributos para, em primeiro lugar, produzir os bens e serviços coletivos, aqueles que escapam da esfera individual para sua solução. É o caso da defesa do território nacional, da operação da Justiça, da segurança pública, das estradas, pontes, praças e avenidas. Em segundo lugar, a sociedade resolveu atribuir ao governo algumas atividades que também podem ser providas pelo setor privado, como a saúde, a educação, a cultura e o turismo.
Chegará o momento em que ou o governo aumenta drasticamente os tributos ou para bruscamente de gastar
Para ofertar os serviços públicos e construir as obras, o governo monta a máquina estatal, composta de funcionários, prédios, equipamentos e materiais no âmbito dos três poderes. Os economistas puristas e defensores da austeridade extrema defendem que o governo deve arrecadar tributos na estrita medida do necessário para cobrir todos os seus gastos e não deve fazer dívidas, sobretudo porque as dívidas impõem o pagamento de juros – reduzindo os orçamentos do futuro para pagar os mesmos gastos – e por exigirem o pagamento do capital principal tomado por empréstimo.
Entretanto, para o caso de obras de custo elevado e retorno longo e lento – como é o caso das ferrovias, das grandes usinas hidrelétricas e dos portos –, é defensável que o governo busque financiamento bancário de longo prazo, como ocorre com os financiamentos tomados dos organismos internacionais, com prazos de 30 anos e taxa de juros relativamente baixa. Esses investimentos, uma vez colocados à disposição da sociedade, são utilizados ao longo de décadas – alguns até por séculos, como é o caso das ferrovias – e faz sentido, portanto, que as gerações futuras ajudem a pagar os custos do investimento e dos encargos de seu financiamento.
O problema começa quando a dívida pública começa a ser usada para pagar déficits gerados por excesso de gastos correntes com pessoal, custeio da máquina estatal e serviços públicos consumidos pelas gerações do presente. Isso está ocorrendo no Brasil. A dívida pública bruta interna e externa em 2008 era de R$ 1,4 bilhão e representava 55% do Produto Interno Bruto (PIB); as previsões mais pessimistas dizem que o endividamento do governo nos três níveis pode terminar 2016 perto de R$ 3,9 trilhões, equivalente a 66% do PIB.
A carga tributária atual gira em torno de 36% do PIB e, se governo não fizer superávit primário (receitas totais menos gastos antes do pagamento dos juros), a dívida crescerá em total equivalente aos juros mais o déficit primário. Nessa situação, chegará o momento em que a escolha terá de ser radical: ou o governo aumenta drasticamente os tributos ou para bruscamente de gastar. Se não fizer isso, restará a saída de emitir moeda e, assim, lançar a economia em inflação e empobrecimento. Já passou da hora de governo e sociedade enfrentarem o problema da dívida pública, pois ela foi longe demais e tornou-se um perigo para o futuro da nação.
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