| Foto: Orlando Brito/Fotos Publicas

A semana tem sido agitada no ninho tucano. Buscando conter a disputa renhida entre grupos antagônicos no PSDB, hoje capitaneados pelos senadores Aécio Neves e Tasso Jereissati, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, resolveu apresentar-se como nome de consenso para assumir a presidência do partido a partir da convenção nacional marcada para o dia 09 de dezembro, um movimento cuja eficácia está longe de garantida. Quase ao mesmo tempo, o Instituto Teotônio Vilela, braço teórico do tucanato presidido por José Aníbal, resolveu lançar “diretrizes para um novo programa partidário” que tentam, aparentemente sem sucesso, agradar gregos e troianos, a começar pelos que hoje compõem o próprio PSDB. O que realmente preocupa nessa agitação é o partido estar se distanciando irreversivelmente de suas bandeiras históricas e de seu legado positivo, aproximando-se cada vez mais de se transformar em uma versão perfumada do PMDB.

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Divergências internas, em geral saudáveis na vida partidária, existem no PSDB há tempos, embora a lógica eleitoral viesse comprometendo, desde a saída do governo, em 2002, a unidade de ação do partido – o que se refletiu na oposição tímida e desnorteada que ofereceu aos governos petistas. Mas agora a confusão chegou a tal ponto que o partido, depois de meses no poleiro, dividido sobre deixar ou não o governo Temer e paralisado sobre o que fazer com o fiasco moral de Aécio Neves, não é capaz sequer de garantir o apoio necessário à reforma da previdência, uma bandeira histórica dos tucanos. Alguns setores chegam até, como condição para a aprovação, a patrocinar uma regra de transição para o funcionalismo, o que contraria um dos pilares do próprio documento lançado esta semana pelo partido: “eliminar privilégios consolidados por décadas”.

O partido está inserto em uma lógica claramente eleitoreira e em uma visão de curto prazo que resvalam até no fisiologismo

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O PSDB nasceu como uma dissidência de centro-esquerda ao velho centrão do PMDB e conquistou seu capital político pela agenda que ofereceu ao Brasil. A modernização do Estado, o Plano Real, a estabilidade do tripé macroeconômico, as privatizações, a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, a inserção e os ganhos de credibilidade internacional para o país, os quadros técnicos que compõem o partido – muitos dos quais cada vez menos consultados na formulação dos planos e estratégias da agremiação – e o compromisso permanente com o saneamento das contas públicas, condição do crescimento econômico que sustente o desenvolvimento. Tudo isso torna ainda mais inaceitável a inconsistência do partido na defesa das reformas.

É verdade que, quando o PSDB resolveu apoiar o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e se lançar no colo de Michel Temer, o partido assumiu os riscos de ligar-se, de forma quase umbilical, a um PMDB conhecido menos por seu projeto moderno de nação que por seu fisiologismo histórico. Mas, considerando o atascadeiro econômico em que o Brasil estava metido e o fato de que o governo Temer e o Congresso conseguiram avançar, embora lentamente, a agenda necessária de reformas, aprovando a PEC do Teto, a terceirização e a reforma trabalhista, a encruzilhada entre a bandeira ética e o problema fiscal ainda podia explicar os dramas do partido.

Opinião da Gazeta: O PSDB se desfaz (editorial de 14 de novembro de 2017)

Leia também: Reforma na Esplanada (editorial de 15 de novembro de 2017)

Esses dramas se exasperavam enquanto as condições morais do Planalto derretiam e o PSDB se mantinha no governo apelando para a premência do problema fiscal. Entretanto, depois de oferecer 21 votos favoráveis a Temer na análise da segunda denúncia na Câmara, pela necessidade da agenda reformista, o partido agora cria entraves justamente para a reforma da previdência e claudica em entregar seus os votos, inserto em uma lógica claramente eleitoreira e em uma visão de curto prazo que resvalam até no fisiologismo.

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Se Geraldo Alckmin assumir o comando do partido e, como anunciou, fizer o PSDB deixar formalmente o governo, o estrago pode já estar feito. Se o eleitorado realmente buscar uma alternativa ao centro em 2018 e o partido se oferecer como tal, ele terá dificuldades para explicar todas as inconsistências de sua trajetória no governo Temer, principalmente se a reforma da previdência naufragar. Mas corre-se o risco de que a plataforma centrista do “Estado nem máximo, nem mínimo, mas musculoso” escamoteie, na verdade, a derrocada moral e programática de um partido que cada vez mais se parece com um PMDB – dividido entre caciques regionais, sem unidade de ação, apenas colhendo e negociando os dividendos de sua capilaridade no país. Oxalá o drama hamletiano do partido não se converta num réquiem funesto da centro-esquerda responsável.