Depois de idas e vindas, o presidente Michel Temer publicou, na segunda-feira, medida provisória que adia para 2020 o reajuste dos servidores públicos inicialmente previsto para 2019. No fim de agosto, Temer havia dito que não adiaria o aumento, além de anunciar que havia cedido aos interesses corporativistas dos ministros do Supremo Tribunal Federal, contradizendo informações anteriores. Tanto vaivém mostra a fraqueza de um presidente em fim de mandato, mas, no caso dos servidores, a publicação da MP foi um acerto.
A manutenção do reajuste teria um impacto de quase R$ 7 bilhões no Orçamento da União. É um dinheiro que não existe – como também não existe dinheiro disponível para diversas outras rubricas, já que o Brasil coleciona déficits primários que superam a centena de bilhões de reais. Seria um problema adicional para o próximo ocupante do Palácio do Planalto, isso, claro, se a população eleger alguém que tenha compreensão clara da necessidade do ajuste das contas públicas, e não um populista irresponsável. Quem demonstrou responsabilidade, no caso, foi a atual equipe econômica, que seguiu tentando convencer Temer mesmo depois que sua intenção de manter o reajuste se tornou pública.
Mesmo sem aumentos recentes, servidores ainda se encontram em posição bastante confortável na comparação com os demais brasileiros
Verdade seja dita, há uma contradição quando Temer adia o reajuste do funcionalismo, mas aceita o pedido dos ministros do Supremo Tribunal Federal por um aumento de 16,38% que terá efeito cascata sobre diversas carreiras, especialmente na magistratura e no Ministério Público. A concessão ao STF é ainda mais vergonhosa quando se sabe que o reajuste não passa de uma tentativa de incorporar definitivamente ao salário dos juízes os valores recebidos hoje por meio de um auxílio-moradia claramente inconstitucional. Mas a solução, neste caso, não seria abrir indiscriminadamente as torneiras, e sim a firmeza de quem tem consciência da gravidade da atual situação fiscal do país e está disposto a contrariar interesses corporativistas para não agravar ainda mais um quadro que já é de calamidade.
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Os servidores têm todo o direito de pressionar seu empregador – no caso, o poder público federal – para conseguirem reajustes. No entanto, eles também precisam compreender que, mesmo sem aumentos recentes, eles ainda se encontram em posição bastante confortável na comparação com os demais brasileiros: apenas a estabilidade no emprego já seria uma grande vantagem neste país de 13 milhões de desempregados, mas as discrepâncias não param por aí. São vários os estudos atestando que as remunerações no serviço público são maiores que as do setor privado, não apenas de forma genérica: as pesquisas recentes têm evitado essa armadilha comparando salários para cargos, experiência e escolaridade idênticos, e mesmo assim a vantagem do servidor sobre o trabalhador da iniciativa privada continua enorme. Estudo do Banco Mundial publicado no fim de 2017 mostra que 93% do funcionalismo civil federal está entre os 40% mais ricos no Brasil. E o país, apesar de ter uma porcentagem de servidores em relação à população menor que a de várias nações desenvolvidas, gasta com eles uma proporção do PIB maior que esses países.
Para manter o reajuste em 2019, associações de servidores já buscaram o Supremo Tribunal Federal, e outras devem fazer o mesmo em breve. O sistema de sorteio adotado pela suprema corte colocou uma dessas ações no colo do ministro Ricardo Lewandowski, que, no fim do ano passado, já havia concedido liminar mantendo para 2018 o reajuste que o governo também queria adiar, liberando o assunto para o plenário apenas quando já não havia nada mais a fazer. Se resolver seguir seu histórico, o ministro terá dado uma dupla contribuição para o desarranjo fiscal brasileiro, já que também foi ele o grande defensor do aumento dos magistrados: uma atitude típica de quem considera que o dinheiro público brota por mágica, ou que o contribuinte brasileiro tem uma capacidade infinita de sustentar a máquina governamental.
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