“Protagonismo” é a palavra da moda em Brasília, definindo o desejo dos mais diversos agentes políticos de serem os “pais da criança” quando se trata de reformas importantes. O governo federal propõs a reforma da Previdência, e o Congresso quis assumir o “protagonismo”, dando a entender que, se não fosse pela articulação dos seus líderes, a reforma jamais sairia. Quando esse mesmo governo demorou para enviar a reforma tributária, Câmara e Senado brigaram pelo “protagonismo”, cada um com uma proposta diferente. Mas o termo também parece indicar o anseio de não ficar a reboque de outros poderes ou instituições. Assim, quando a mesma Câmara que chama para si a responsabilidade por aprovar a Nova Previdência desidratou a reforma, diminuindo seu impacto positivo nas contas públicas e reduzindo seu caráter igualitário, o Senado não quis ficar atrás.
Durante o primeiro turno de votação no plenário do Senado, na terça-feira, o texto-base foi aprovado com relativa tranquilidade, pelo placar de 56 votos a 19. Mas, quando chegou o momento de votar destaques, a tentação de tirar mais uma lasquinha do projeto enviado originalmente por Jair Bolsonaro e Paulo Guedes falou mais alto. A redução do limite de renda exigido para o abono salarial, dos atuais dois salários mínimos para R$ 1.364 mensais, foi derrubada graças a um destaque do Cidadania. Com a manutenção da regra atual, a economia projetada em dez anos caiu mais R$ 70 bilhões, ficando em R$ 800 bilhões, de acordo com os cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), que assessora o Senado. “Economia”, é preciso reforçar, é mera força de expressão, pois a reforma não fará sobrar dinheiro nos cofres públicos; trata-se apenas de evitar que o governo se endivide mais e cave um buraco fiscal mais fundo.
A desidratação final da PEC 6/2019 já chegou ao dobro do que o governo considerava aceitável
Diante do revés, a base do governo no Senado achou melhor se recolher, dar a noite por encerrada e deixar para votar os outros destaques na quarta-feira. Desta vez, a mobilização funcionou e todos eles foram retirados ou rejeitados – se aprovados, eles teriam drenado mais R$ 200 bilhões da reforma, cortando-a pela metade, já que a economia prevista inicialmente era de R$ 1,2 trilhão em um período de dez anos.
Quando o Poder Executivo encaminhou ao Congresso a PEC 6/2019, já era evidente que ela não passaria intacta pelo trâmite legislativo. Vários de seus trechos enfrentariam resistências das mais diversas: há os que, por ideologia, discordam de pontos importantes da proposta; os que buscariam manter privilégios corporativistas; e os que estavam simplesmente interessados em enfraquecer a reforma para atingir o presidente Bolsonaro. Isso sem falar da possibilidade de que alguns itens tivessem uma redação especialmente dura para servir de “bois de piranha”, permitindo ao Planalto fazer concessões enquanto preservava o núcleo da reforma. A certa altura, a própria liderança do governo no Congresso falou em R$ 1 trilhão como um impacto ainda aceitável – ou seja, aceitava-se perder R$ 200 bilhões. A desidratação final da PEC 6/2019 já chegou ao dobro disso, e há dúvidas sobre a capacidade de a “PEC paralela” conseguir compensar ao menos parte do estrago.
Com a tramitação finalmente chegando a seu fim – agora, falta apenas uma votação no plenário do Senado, que deve ocorrer em uma ou duas semanas –, o país é capaz de avaliar qual será o verdadeiro impacto da reforma da Previdência aprovada. É bem possível que, de tanto ter sido retalhada, ela acabe sendo insuficiente para colocar o país em uma rota de responsabilidade fiscal. Se a PEC paralela naufragar ou for igualmente desidratada, os próximos anos devem nos reservar novas reformas previdenciárias para concluir o que não foi feito agora.
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