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| Foto: LULA MARQUES/Fotos Públicas

A sociedade brasileira recebeu com um misto de satisfação e familiaridade a condenação do deputado Nelson Meurer (PP-PR) por corrupção passiva e lavagem dinheiro pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Satisfação, porque se trata da primeira condenação de um parlamentar com foro privilegiado decorrente das investigações da Operação Lava Jato na suprema corte do país. Familiaridade, porque o caso escancara, mais uma vez, o contraste entre a eficiência da primeira instância da Justiça e a lentidão de Brasília na resposta a casos de corrupção. Meurer foi condenado a 13 anos, 9 meses e 10 dias de prisão em regime inicial fechado, a uma multa de R$ 322 mil e a indenizar a Petrobras em R$ 5 milhões, mas caberá à Câmara decidir se o deputado perde ou não o mandato.

O deputado foi denunciado em outubro de 2015 pela Procuradoria-Geral da República (PGR) – no bojo da temida “Lista do Janot”, à qual se seguiria ainda o “Listão” de março de 2017, decorrente da delação dos Executivos da Odebrecht. Em junho de 2016, Meurer virou réu no STF por ter recebido cerca de R$ 30 milhões em vantagens indevidas provenientes dos desvios de verba da Petrobras. O deputado, integrante da cúpula do Partido Progressista, que sustentava politicamente Paulo Roberto Costa na diretoria de abastecimento da Petrobras entre 2004 e 2012, teria solicitado e recebido inúmeros repasses ilegais, intermediados pelo doleiro Alberto Youssef e ocultados por contratos fraudulentos de consultoria. Dois filhos de seus filhos, Nelson Meurer Junior e Cristiano Meurer, também foram condenados por corrupção passiva por participarem do esquema.

Só em Curitiba, 131 pessoas já foram condenadas até agora

Ainda que a condenação de Meurer seja alvissareira, o abismo entre o Supremo e as instâncias inferiores salta aos olhos. Em quatro anos de operação Lava Jato, foram 160 pessoas condenadas em primeira instância, 77 em segunda instância e 2.384 anos de penas foram aplicados, somando as condenações da Justiça Federal do Paraná e do Rio de Janeiro. Os acordos de delação premiada devem recuperar cerca de R$ 12 bilhões aos cofres públicos, sendo que por volta de R$ 2 bilhões já foram devolvidos. Só em Curitiba, 131 pessoas já foram condenadas até agora. O fato é emblemático: enquanto o juiz Sérgio Moro demorou pouco mais de um ano para condenar um réu pela primeira vez, o Supremo levou mais de três. Embora cerca de 50 congressistas sejam alvo de inquéritos da Lava Jato na corte, apenas dez já se tornaram réus.

Opinião da Gazeta: Foro privilegiado: o que vem pela frente (editorial de 04 de maio de 2018)

Olhando os números com realismo, sabe-se que não se trata de leniência do STF, mas de ineficiência do próprio modelo atual. O Supremo congrega as funções de corte constitucional, exercendo o controle de constitucionalidade abstrato dos atos normativos, de instância revisora de toda a Justiça brasileira como “quarta instância” e de tribunal originário para investigação e julgamento de série de autoridades com foro privilegiado – o peso desse último fator tende a se reduzir em decorrência da decisão, no início deste mês, de restringir o foro de parlamentares federais para crimes ocorridos durante o mandato e em função dele. Mas isso não é só. Vários ministros já apontaram que a Lei 8.038/1990, que disciplina o processo da ação penal originária nos tribunais superiores, é bem mais rígida nos procedimentos do que o Código de Processo Penal. Mais ainda, cada ato processual que depende de manifestação da PGR tende a se protelar também, já que o próprio órgão tem uma série de atribuições constitucionais pelas quais zelar. Sendo assim, o sucesso dos processos penais na corte acaba por depender do imenso empenho individual dos ministros, como foi o caso do ex-ministro Joaquim Barbosa na Ação Penal 470, o “Mensalão” – que, malgrado todo esse esforço, levou quase cinco anos para ser julgada desde a denúncia.

Opinião da Gazeta: a Lava Jato e as eleições (editorial de 29 de novembro de 2017)

A sociedade brasileira espera que o STF siga no caminho inaugurado ontem (29), correndo atrás desse prejuízo todo, e tudo indica que a senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) pode ser a próxima a ser julgada. Mas os brasileiros sabem bem que, por mais que o tribunal e seus ministros se esforcem, a corte suprema nunca será tão eficiente quanto uma Justiça de primeira instância descentralizada para julgar ações penais e conduzir investigações criminais de tal monta. Por isso, é imprescindível que os ministros decidam logo quais casos em suas gavetas devem ser encaminhados às instâncias inferiores, e que o Congresso Nacional cumpra sua missão institucional e restrinja drasticamente as hipóteses de foro privilegiado. Esse será um primeiro passo não só para reduzir a impunidade, mas para que o Supremo se dedique com profundidade à sua função precípua de guardião e intérprete da Constituição.

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