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O fosso entre a Câmara Municipal de Curitiba e a população aprofunda-se a cada dia. À costumeira irrelevância de sua atuação política e legislativa e à complacência e cumplicidade da maioria aliada e comprometida com seu presidente, vereador João Cláudio Derosso, somou-se na última terça-feira a absurda decisão do Conselho de Ética de arquivar processos internos que pesavam contra ele. Não fosse a discutível sobrevivência da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada para investigar a regularidade dos gastos de R$ 31,5 milhões em propaganda autorizados por Derosso, e a Câmara já teria completado a obra de renúncia aos princípios legais e morais a que está obrigada a cumprir.

A alegação apresentada para o arquivamento dos procedimentos que tramitavam no Conselho chega a ser risível. Segundo seus proponentes, como Derosso "voluntariamente" licenciou-se da presidência por 90 dias, perderam objeto os processos que poderiam, no máximo, redundar no seu afastamento pelo mesmo prazo. Ora, não é exatamente a pena que a Câmara poderia em tese impor ao seu principal mandatário a questão que mais interessa. E sim a completa investigação pela própria Câmara dos fatos que deram origem aos processos de quebra do decoro parlamentar. A esta obrigação os vereadores – com exceção dos sete que compõem a bancada de oposição – simplesmente abdicaram, numa clara demonstração do interesse em manter nas catacumbas muitos fatos nos quais, por ação ou omissão, podem estar comprometidos.

Felizmente, outras instituições, antes mesmo que qualquer iniciativa fosse tomada pela Câmara, vinha preenchendo a lacuna deixada pelos vereadores. Levantamentos do Tribunal de Contas deram conta do absurdo acúmulo de irregularidades havidas nos processos de licitação, contratação e aplicação dos recursos destinados à publicidade da Câmara. A conclusões semelhantes chegou também o Ministério Público Estadual, que prontamente propôs ação à Justiça requerendo o afastamento do acusado presidente, o bloqueio de seus bens e a devolução aos cofres públicos dos R$ 5,1 milhões que foram administrados pela agência Oficina da Notícia, de propriedade de sua esposa, servidora da Casa quando da contratação de sua empresa.

Essas ações externas resultaram, até o momento, na esperta decisão de Derosso de requerer a licença de 90 dias – período que, aliás, em parte, coincidirá com o recesso parlamentar. Entretanto, terá de responder aos processos em boa hora iniciados e ainda com longo caminho a percorrer naquelas duas instâncias – contando nesse tempo que o espera com a "vantagem" da natural lentidão com que tramitam e com o esmaecimento da memória popular.

Acatadas as acusações, pode a Justiça julgar necessário aplicar aos responsáveis pelos desvios as penas previstas nos códigos. Entretanto, a justiça política, aquela que se faz na urna eleitoral, ainda cabe ao povo fazer.

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