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Depois de muita polêmica entrou em vigor esta semana, na França, a lei que proíbe o uso em público da burca, vestimenta que reveste a mulher da cabeça aos pés, e o niqab, um véu que cobre apenas o rosto, à exceção dos olhos. A questão é das mais controversas e, como tal, inevitavelmente tem o condão de acirrar os ânimos entre defensores e críticos da medida tomada pelo governo francês. De um lado e de outro sobram argumentos para embasar pontos de vista pró e contra a determinação legal que já vem provocando protestos pelo país e até detenções de muçulmanas dispostas a desafiar a lei pelo direito de usarem um ou outro.

A dificuldade de se entender o imbróglio começa pela dimensão que uma simples vestimenta usada pelas mulheres seguidoras do Islã ganhou hoje na Europa e em particular na França, primeiro país a restringir oficialmente o seu uso em público. A ameaça de atentados perpetrados por terroristas – homens ou mulheres – supostamente protegidos pelo anonimato com o uso da burca; a condição da França de Estado laico; e o entendimento de que a obrigatoriedade do véu configura uma violação ao direito da mulher muçulmana à igualdade com o homem justificariam a lei.

Muito embora tais argumentos possam fazer sentido para muitos, cabem aqui alguns questionamentos: a começar pelos limites do Estado para tomar tal medida. É notório que o uso do véu, cubra total ou parcialmente o corpo da mulher, faz parte dos usos e costumes muçulmanos e, como tal, é cabível proibir o seu uso? Além disso, existe na indumentária o componente religioso que também acaba sendo cerceado pelo Estado francês. Porém, se o objetivo for o de endurecer com o fundamentalismo islâmico, o tiro pode sair pela culatra, com a França correndo o risco, então, de assistir a um acirramento do radicalismo por parte da comunidade muçulmana da França.

Não se pode também descartar que a medida tomada pelo presidente Nicolas Sarkozy traz uma dose de componente xenofóbico, sentimento que vem aumentando nos últimos anos nos principais países europeus, entre eles a França. Sob essa ótica, argumentam os defensores da medida que a proibição do uso de véus seria um passo necessário para a preservação da cultura francesa, de certa forma afetada pela popularização dos usos e costumes muçulmanos no país.

Polêmica à parte, a verdade é que numa sociedade onde prevalecem os princípios democráticos, homens e mulheres devem ter o direito de expressar livremente seus pensamentos, suas convicções políticas e religiosas desde, é claro, que não prejudiquem terceiros. Diante disso, é perfeitamente compreensível que o uso da burca seja tolerado como manifestação de pessoas que através da vestimenta professam uma fé ou um modo de vida. Tal condição é a que deve prevalecer, ainda que Sarkozy tenha procurado dar à lei um caráter de defesa da condição feminina, ao afirmar que "o uso da burca reduz a mulher à servidão e ameaça a sua dignidade". Não seria, segundo ele, "um sinal de religião, mas de subserviência".

Como se vê, a celeuma é grande e promete ainda muitos desdobramentos. Vale terminar com o alerta da Human Rights Watch, uma das mais respeitadas organizações internacionais de direitos humanos, para quem a liberdade de expressar a religião e a liberdade de consciência são direitos fundamentais e proibir a burca não fará mais do que estigmatizar e marginalizar as mulheres que a utilizarem.

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