O novo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, tem o perfil técnico que, neste espaço, havíamos pedido para o sucessor de Henrique Meirelles, que deixou a pasta para disputar as eleições de outubro, ainda esperando ser o escolhido do MDB para encabeçar a chapa do partido. Mas o compromisso de Guardia com o ajuste fiscal iniciado por seu antecessor tem tudo para esbarrar em grandes obstáculos colocados diante dele pelo Legislativo e pelo Judiciário, com uma mãozinha da ala mais política do próprio Poder Executivo.
O Congresso Nacional já tinha destruído o programa de renegociação de dívidas tributárias desenhado pela Receita Federal no início de 2017, transformando-o em um Refis igual a qualquer outro, cheio daqueles descontos camaradas aos devedores que levam os bons contribuintes a se perguntar se estão fazendo a coisa certa. Com isso, o governo perdeu R$ 6 bilhões em arrecadação prevista. Agora, o Legislativo derrubou o veto do presidente Michel Temer a outro programa semelhante, desta vez direcionado a micro e pequenas empresas, que agora terão 90% de desconto nos juros e 70% nas multas. E a derrubada do veto ocorreu com o apoio do próprio governo.
Há obstáculos colocados pelo Legislativo e pelo Judiciário, com uma mãozinha da ala mais política do próprio Executivo
É verdade que as micro e pequenas empresas são o grande motor da economia nacional, líderes em geração de empregos. Também é fato que que, por seu porte, elas são mais vulneráveis a grandes choques, como a recessão provocada por anos de irresponsabilidade lulopetista. Mas o Refis das Micro tem o mesmo problema de fundo dos demais Refis, que é o desprezo por aquelas empresas que, mesmo diante da turbulência, conseguiram cumprir suas obrigações com o Fisco. Se a intenção do governo era a de ajudar as micro e pequenas empresas a se reerguer, não haveria como fazer isso sem abrir mão de estimados R$ 7 bilhões em 15 anos?
O programa de privatizações do governo também está sob ataque. Em janeiro deste ano, a venda da Eletrobras foi suspensa por liminar da Justiça Federal em Pernambuco, mas o ministro do STF Alexandre de Moraes derrubou a decisão. Agora, a oposição, por meio de obstrução, tem impedido os trabalhos da comissão da Câmara dos Deputados que discute um projeto de lei sobre a privatização (uma outra comissão, mista, analisa a medida provisória que trata das novas regras para o setor elétrico, incluindo o programa de desestatizações). Na reforma ministerial forçada pelas saídas de ministros que têm pretensões eleitorais em outubro, o Ministério das Minas e Energia ficou nas mãos de Moreira Franco, que Temer só mantém na Esplanada para não lhe retirar o foro privilegiado.
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As ameaças, no entanto, não estão apenas no lado das receitas e na continuação do vício governamental de contar com recursos extraordinários, como os provenientes de privatizações, concessões e Refis, para cumprir suas metas (que já são bastante problemáticas, com déficits primários anuais que superam os R$ 100 bilhões). Também do lado das despesas a pressão é forte. A principal bomba-relógio é, sem dúvida, a Previdência Social, cuja reforma o governo já abandonou. Mas há também o reajuste do funcionalismo, que o governo pretendeu adiar por um ano por meio de medida provisória publicada em outubro de 2017. Desta vez, foi o Supremo, por meio de liminar do ministro Ricardo Lewandowski concedida em dezembro do ano passado, que interveio para recolocar esse gasto no orçamento federal. O plenário do STF não analisou o assunto, a MP já caducou e o primeiro reajuste já foi aplicado, com outro aumento previsto para janeiro de 2019.
O governo federal não tem como impedir que Judiciário e Legislativo atuem com irresponsabilidade quando se trata das contas públicas, mas piora a situação quando compactua com decisões que cortam receitas ou aumentam gastos, como no caso da derrubada do veto ao Refis da microempresas. Os esforços iniciados em 2016 não podem ser substituídos por um clima de “fim de feira”, como se pouco importassem as condições fiscais em que o próximo presidente receberá o país. É bem possível que o início de 2019 seja o fim da linha para alguns que já não estarão na Praça dos Três Poderes; mas o Brasil continua, e quem está hoje no governo, no Congresso e no Supremo e tem um mínimo de responsabilidade precisa trabalhar para que o país não volte a afundar na crise.
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