A Operação Politeia, lançada na terça-feira pela Polícia Federal, abalou o mundo político com várias ações de impacto. Foram cumpridos 53 mandados de busca e apreensão, e agora o país inteiro conhece os carros de luxo que o ex-presidente e atual senador Fernando Collor guardava na garagem da tristemente famosa Casa da Dinda. Collor não foi o único político a ter sua residência ou escritório na mira da PF: os senadores Ciro Nogueira, piauiense e presidente nacional do PP, e Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE); o ex-ministro Mario Negromonte; o deputado federal Eduardo da Fonte (PP-PE); e o ex-deputado João Pizzolati (PP-SC) também estavam entre os alvos da Politeia, um desdobramento da Operação Lava Jato. Tudo foi feito com autorização do Supremo Tribunal Federal: os responsáveis por emitir os mandados foram os ministros Teori Zavascki, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
Não surpreende que as reações tenham sido estridentes – e não apenas por parte daqueles que foram atingidos pela Operação Politeia. Obviamente, o senador Fernando Collor foi o mais estridente. Disse que o país vive sob uma “ditadura do Ministério Público Federal”; que o órgão está “deformando o Estado de Direito e desvirtuando princípios da democracia”; que o Senado e o Poder Legislativo como um todo foram “humilhados”. Mas os presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha e Renan Calheiros, também se manifestaram. Embora ambos não estivessem entre os que receberam a visita da Polícia Federal, seus nomes constam da lista de políticos investigados pela Lava Jato; nada impede que, num futuro próximo, também eles sejam alvo de novas operações. Em nota lida durante sessão do Senado, Calheiros criticou “métodos que beiram a intimidação” e disse que a ação consistiu em uma “invasão” que viola garantias constitucionais. Já Eduardo Cunha preferiu a ironia. “A porta da minha casa está aberta (...) Eu acordo às 6 horas, que não cheguem antes das 6, para não me acordar”, disse.
Calheiros e Cunha estão convencidos de que só entraram na lista de Rodrigo Janot por influência pessoal de Dilma
No comando do Senado, Calheiros passou anos sendo subserviente ao Palácio do Planalto, que o apoiou na mais recente eleição para a presidência da Casa. Eduardo Cunha subiu ao posto atual já em rota de choque com o governo, tendo vencido o petista Arlindo Chinaglia na disputa. Desde que a relação dos políticos investigados foi divulgada, meses atrás, ambos estão convencidos de que só entraram na lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por influência pessoal de Dilma Rousseff. E têm aproveitado diversas oportunidades para dinamitar o Planalto, impondo derrotas ao governo em questões que vão da reforma da Previdência à redução da maioridade penal.
O arsenal de Eduardo Cunha para tentar se livrar da espada de Dâmocles que pende sobre sua cabeça ainda não está esgotado. O presidente da Câmara usou o vice-presidente Michel Temer, companheiro de partido, para avisar que a relação entre PMDB e PT acabou e que, na volta do recesso parlamentar, Cunha não pensará duas vezes antes de instalar Comissões Parlamentares de Inquérito altamente inconvenientes para o governo, como a dos fundos de pensão e a do BNDES, que tem recebido críticas da oposição pelo segredo que envolve empréstimos feitos pelo banco de fomento a governos estrangeiros, especialmente aqueles aliados ideologicamente ao PT. Sem falar que também depende do Congresso a abertura de um eventual processo de impeachment contra Dilma.
Não há dúvida de que esses são temas que merecem, sim, investigação detalhada, seja por parte de uma CPI, seja por outros órgãos de Estado que podem cumprir esse papel. Mas a ameaça de Cunha deixa subentendido que os escândalos dos fundos de pensão e do BNDES podem simplesmente ser varridos para debaixo do tapete se a Polícia Federal for “colocada na linha”, deixando em paz os chefes do Poder Legislativo. Usar CPIs sobre temas relevantes, ou mesmo o impeachment, como chantagem para impedir constrangimentos só demonstra o nível rasteiro da política travada pelos que ocupam alguns dos mais altos cargos da nação.