Apesar da crise, há três negócios que prosperam muito no país: fundar um templo, registrar um partido político e criar um sindicato. Do primeiro, não há o que se falar: os fiéis são livres para contribuir para a igreja e com isso mostram sua concordância com o que ouvem nas pregações. Já quanto às outras duas entidades, direta ou indiretamente, somos todos nós, os trabalhadores e contribuintes, que compulsoriamente destinamos uma parte do que ganhamos para sustentá-los, concordemos ou não com o que fazem com o nosso dinheiro – aliás, não raras vezes contra os nossos interesses e contra o interesse coletivo.
Partidos se abastecem do Fundo Partidário, verba pública multimilionária distribuída entre as legendas e teoricamente destinada a “financiar a democracia”. Na prática, os recursos mais servem para sustentar ambições políticas – nem sempre republicanas – de seus dirigentes, o que explica a existência de 35 partidos em atuação e outras dezenas na fila para obter registro na Justiça Eleitoral. Os milhões do Fundo Partidário caem sem mérito em seus cofres, e a abertura de infinitas e rendosas possibilidades de negócios, especialmente em períodos eleitorais, explica a pletora de legendas sem ideologia, doutrina ou programa postas à disposição para aluguel.
Ao trabalhador não se dá o direito de escolha, se deseja contribuir ou não com o sindicato de sua categoria
De forma semelhante, criam-se sindicatos às pencas. Já são mais de 10 mil no país, número que ganha maior expressão quando comparado, por exemplo, aos apenas 100 existentes na Argentina. Basta que obtenha registro no Ministério do Trabalho para que, imediatamente, um sindicato se habilite à partilha de cerca de R$ 3,5 bilhões por ano recolhidos na forma de “imposto sindical” – fundo constituído pelo desconto obrigatório do valor de um dia de trabalho por ano que recai sobre todos, sejam ou não sindicalizados.
O imposto sindical, criado na era getulista, mais objetivava o controle governamental, de caráter político, sobre as entidades classistas. Dele derivaram a multiplicação de sindicatos de fachada e o peleguismo. Manter a contribuição sindical compulsória é não somente ignorar as transformações operadas no mundo do trabalho, mas também perpetuar um sistema decrépito, descolado da realidade e prejudicial aos próprios trabalhadores. A eles não é dado o direito de escolha: se querem ou não contribuir para sua entidade de classe, se devem ou não fazê-lo por concordar ou discordar de sua atuação – que frequentemente extrapola as questões trabalhistas da categoria representada para mergulhar na militância político-partidária.
Não se trata de reduzir a importância das entidades sindicais, que proporcionam aos trabalhadores uma instância de defesa de seus direitos diante dos patrões; nem de defender que elas sejam privadas dos meios para sua subsistência, indispensáveis para que cumpram a representação de suas respectivas categorias. Mas também não é admissível a manutenção da obrigatoriedade indiscriminada de contribuir. Assim como defendemos que os partidos políticos sejam sustentados apenas pelos que compartilham dos seus ideais, também é justo que os sindicatos sejam bancados por seus filiados ou pelos que, mesmo sem uma vinculação formal com a entidade, a ela façam contribuições voluntárias. Assim, serão forçados a “mostrar serviço”, empenhando-se na defesa de seus representados e afastando-se de politicagens que nem sempre lhes dizem respeito.
Diversos projetos de lei propõem a extinção do imposto sindical ou sua transformação em contribuição facultativa. Também o substitutivo do relator da reforma trabalhista, deputado Rogério Marinho, previa que qualquer desconto em folha de pagamento direcionado a sindicato devesse ocorrer apenas com autorização expressa do trabalhador. A medida, aprovada pela Câmara, ajuda a explicar a virulência dos protestos contra o governo Michel Temer realizados na sexta-feira passada. Mas ela é um avanço do bom senso que, esperamos, seja confirmado quando o Senado apreciar o projeto que moderniza a legislação trabalhista brasileira.
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