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Com “pedalada” ou sem “pedalada”, eis a questão. O governo da presidente Dilma Rousseff ainda bate cabeça quando analisa se deve ou não contabilizar as “pedaladas” do ano passado para calcular o tamanho do rombo nas contas públicas deste ano. Em 2014, a União tomou emprestados dos bancos oficiais (BNDES, Caixa e Banco do Brasil) R$ 40 bilhões para cobrir despesas típicas do Tesouro e até agora não devolveu o dinheiro devido. Se resolver que deve inscrever esta dívida entre os compromissos que não consegue honrar, o déficit de 2015 chegará a perto de R$ 100 bilhões; se, ao contrário, não incluí-la, o déficit cai para R$ 50 bilhões.

Que diferença faz esta discussão? Por um lado, quase nenhuma: uma e outra situação tão somente revelam que o governo foi incapaz de produzir sobras orçamentárias – isto é, superávit primário – para garantir o pagamento de juros da dívida pública. Uma ou outra situação é mais do que suficiente para alertar o mercado e as agências internacionais de risco de que o Brasil está derrapando na curva e, portanto, já merecendo novos rebaixamentos nos índices de confiança dos investidores. Mas, por outro lado, a diferença é enorme. Antes, considerava-se que o déficit poderia chegar a R$ 50 bilhões contando as “pedaladas”. Agora, esse rombo se observa mesmo sem incluir o golpe fiscal de 2014. Incluir as “pedaladas” significa nada mais, nada menos que “dobrar a meta” – para usar uma das muitas frases folclóricas de Dilma Rousseff –, mas, neste caso, a meta infelizmente é negativa.

Nada foi o bastante até agora para o país navegar em águas mais tranquilas

Embora seja uma questão formal de contabilidade pública a necessidade de contabilizar as “pedaladas”, não é este o problema fundamental que deve afligir o país. O que deve preocupar a todos é a incapacidade que o governo vem demonstrando de apontar e seguir caminhos seguros rumo à recuperação, já que nem mesmo tem obtido resultados palpáveis no ajuste fiscal com que se comprometeu no início do ano.

Ajuste fiscal significa equilibrar as colunas de receita e despesa e, de preferência, alcançar um saldo positivo de reservas para garantir tranquilidade durante eventuais borrascas globais e segurança para os investidores. Um cenário assim só se constrói mediante aumento de arrecadação com concomitante diminuição de gastos. A primeira parte da equação foi parcialmente cumprida, com a elevação de impostos e cancelamento de desonerações. A segunda, nem de longe: basta ver a dificuldade de fazer até mesmo o mais simples, que depende somente de uma caneta – a extinção de 3 mil cargos comissionados e a exoneração de seus atuais ocupantes.

Nada, portanto, foi o bastante até agora para o país navegar em águas mais tranquilas. Ainda se discute muito sobre a coluna da receita, objetivando-se dar-lhe uma nova fonte – no caso, a recriação da CPMF. Seria para vigorar em 2016? Ou, quem sabe, só seja possível para 2017? O “imposto do cheque”, a ser destinado para a Previdência Social, representaria um ingresso calculado em R$ 30 bilhões. Não resolve o problema na integralidade, mas ajudaria, tanto que a CPMF foi considerada o “plano A, B, C e D” do governo pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, no fim de setembro. Sem ela, o governo simplesmente não tem a menor ideia do que fazer para evitar novos déficits.

O que se vê no Planalto é inércia pura. Contabilizar ou não as “pedaladas”? Demitir ou não demitir? Criar ou não criar a CPMF? Tanta indecisão deixa o país sem horizontes, situação fatal para quem precisa enxergá-lo, mas não consegue saber para que lado deve se virar. Enquanto isso, a inflação dispara, o desemprego cresce, a economia para, a recessão se torna mais aguda.

É bem verdade que se pode debitar parte da inércia do governo na área econômica ao conturbado quadro político e à consequente e proposital falta de colaboração do Legislativo, cuja atividade mais visível tem sido a de criar obstáculos a quaisquer iniciativas de saneamento, movido não por eventual interesse público, mas sobretudo em razão da sede de vingança e instinto de preservação do enxovalhado presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha. Lá, a dúvida cruel que alimenta os espíritos é outra: impeachment ou não impeachment?

E, de dúvida em dúvida, de “pedalada” em “pedalada”, o Brasil se petrifica pelas forças da inércia.

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