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Editorial

O perigo de não aprovar a reforma da Previdência

 | André Rodrigues/Gazeta do Povo
(Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo)

No mundo real – ou seja, não naquele mundo de ilusão onde não existe déficit da Previdência e que bastaria cobrar os grandes devedores para resolver os problemas de caixa do governo –, cada ano que se passa sem uma reforma ampla no sistema de aposentadorias ajuda a puxar o país para baixo. O rombo anual nos regimes dos trabalhadores da iniciativa privada, dos servidores públicos civis e dos militares supera em muito os déficits primários que o Brasil acumula, sinal de que o país é incapaz de controlar seus gastos. A bomba-relógio armada por regras obsoletas que privilegiam certos setores e foram feitas tendo em mente uma população jovem pode explodir mais cedo do que se imaginava. A Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia divulgou, na sexta-feira, uma projeção assustadora: sem reforma da Previdência, a recessão voltaria já no segundo semestre do ano que vem.

Não se trata de terror infundado para convencer os parlamentares e a população. A lógica das projeções é muito simples: sem interromper a espiral de gastos causada pelo atual regime previdenciário, o governo será obrigado a ampliar seu endividamento, o que está na origem da mais recente crise econômica, gerada pela Nova Matriz Econômica lulodilmista e da qual o Brasil ainda se recupera aos trancos e barrancos. A necessidade de emitir mais dívida forçará o governo a pagar juros maiores para que o mercado financeiro aceite comprar títulos de um país com finanças públicas fora de controle. No entanto, a elevação dos juros sufocará o setor produtivo, atrapalhando investimentos e a geração de emprego.

Ninguém deveria alimentar a ilusão de que a reforma da Previdência, sozinha, fará o país crescer

Sem reforma, afirma a SPE, a Selic, que hoje está no menor patamar da série histórica, em 6,5%, poderia chegar a 18,5%, uma taxa maior que aquela praticada no auge da crise no governo Dilma, enquanto o desemprego poderia subir para 15,1%. As projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto com e sem reforma também mostram a necessidade da mudança nas regras da aposentadoria. Se nada for feito, o PIB brasileiro cresceria apenas 0,8% em 2019 e 0,3% no ano que vem, com retração no segundo semestre de 2020. A partir daí, o PIB entraria em campo negativo. Se o Congresso aprovar a proposta de Paulo Guedes, as previsões são bem melhores: crescimento de 2,9% neste ano e em 2020, chegando a 3,3% daqui a quatro anos.

Ninguém, entretanto, deveria alimentar a ilusão de que a reforma da Previdência, sozinha, fará o país crescer, e o governo demonstra ter essa consciência. Mas ela é um ponto de partida necessário para estancar a sangria nas contas públicas e dar a Bolsonaro e Paulo Guedes alguma folga para continuarem trabalhando nas demais medidas que permitirão um crescimento consistente e duradouro. Reforma tributária, medidas desburocratizantes, ampliação da liberdade econômica e abertura comercial continuam a ser fundamentais para o Brasil, mas terão pouco efeito prático se o rombo da Previdência não tiver sido resolvido antes. A batalha travada ao longo dos próximos meses, tanto no Congresso quanto na opinião pública, será crucial para a viabilidade fiscal de um país que continua vendo a dívida pública subir descontroladamente.

Os números que vão emergindo a respeito dos impactos positivos da realização da reforma, ou das consequências negativas de se manter tudo como está, mostram como são vazios os slogans usados pela oposição à reforma. A alegação de que o brasileiro terá de “trabalhar até morrer” para conseguir sua aposentadoria se a reforma passar, por exemplo, poderia muito bem ser invertida: é a manutenção de um sistema deficitário, condenado à insolvência, que acabaria de vez com a aposentadoria, fazendo o trabalhador esticar sua permanência no mercado de trabalho – isso, claro, se houver emprego, em um ambiente dominado por recessão e juros altos. Hoje, a desinformação, intencional ou não, é um obstáculo tão ou mais forte que o fisiologismo de congressistas que terão de votar a proposta.

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