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Editorial

O preço da fanfarronice de Joesley

 | Rovena Rosa/Agência Brasil
(Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

A sabedoria popular tem vários provérbios que tratam do triste fim de quem fala demais. É, definitivamente, o caso de Joesley Batista, que, como os peixes, “morreu pela boca”, em um caso no qual a fanfarronice se viu aliada ao descuido: sua conversa comprometedora com o também empresário e delator da J&F Ricardo Saud foi gravada e acabou parando nas mãos da Procuradoria-Geral da República, que viu nela motivo para pedir (e conseguir) a prisão da dupla. Além disso, nesta segunda-feira, decisão do juiz federal Vallisney de Souza Oliveira suspendeu o acordo de leniência da J&F, controladora do frigorífico JBS. “Nós não vai ser preso”, bravateava Joesley no áudio. Agora, ele e Saud estão na Superintendência da Polícia Federal, em Brasília.

Tanta arrogância, no entanto, custou caro não apenas para os delatores, mas para o país inteiro. Isso porque ela se aliou à ingenuidade do procurador-geral Rodrigo Janot, que, fascinado com a possibilidade de conseguir pegar o presidente da República, ofereceu a Joesley todos os benefícios possíveis e imagináveis, recusados a qualquer outro delator da Operação Lava Jato. O empresário contava com essa ingenuidade: “Nós somos do serviço, né? [A gente] vai acabar virando amigo desse Ministério Público, você vai ver. Nós vai virar amigo desse Janot. Nós vai virar funcionário desse Janot. Nós vai falar a língua deles. Você sabe o que que é?”

Janot não estranhou o fato de Joesley ter pouquíssimo a dizer sobre os ex-presidentes Lula e Dilma

Tratava-se, segundo Joesley, de “falar a língua dos procuradores” e “chamar todo mundo de ladrão”. Com algumas exceções, é claro – Janot não estranhou o fato de Joesley ter pouquíssimo a dizer sobre os ex-presidentes Lula e Dilma, aqueles a quem o empresário devia praticamente tudo, pois foram eles que elegeram sua empresa para ser uma “campeã nacional”, irrigando-a com generosos recursos do BNDES para que a JBS se tornasse uma gigante com atuação internacional.

E assim, precipitadamente, Janot fechou um acordo de delação premiada que zombava do país ao garantir a impunidade a um criminoso confesso. Um grotesco erro de avaliação, ainda que cometido de boa fé (não há, até o momento, elementos que permitam concluir que o procurador-geral estivesse em conluio com Joesley e Saud). Tudo para conseguir preparar uma denúncia contra Michel Temer, enquanto todo o resto do material da Lava Jato aparentemente podia esperar.

O preço a pagar foi alto: por uma delação acertada às pressas, em que dois empresários passaram a perna no procurador-geral da República, criou-se um terremoto político que ameaçou a aprovação das reformas essenciais para colocar o país em uma rota sustentável no longo prazo – especialmente a reforma da Previdência. O Congresso livrou Temer, cobrando do presidente o tradicional preço em forma de cargos e liberação de emendas, mas àquela altura as mudanças necessárias nas regras de aposentadoria já tinham deixado de ser prioridade, substituídas pela reforma político-eleitoral. Só agora a equipe econômica volta a falar em Previdência, confiando em uma votação em outubro – até porque, passado o início do próximo mês, nenhuma eventual mudança eleitoral terá aplicação em 2018, e por isso alterações nas regras eleitorais tenderão a cair no esquecimento dos parlamentares.

Eventuais crimes cometidos por Michel Temer não podem ficar impunes, por óbvio. Mas a maneira atabalhoada como Rodrigo Janot tentou atingir o presidente se voltou contra o próprio procurador-geral e os delatores. No fim, foram quatro meses perdidos, que podem não ser muito em termos de uma reforma cujos benefícios miram mais no longo prazo, mas, com a Previdência já encaminhada, o governo já poderia estar trabalhando na reforma tributária e em outras medidas para combater o desemprego – este, sim, um problema urgente, já que 13 milhões de brasileiros não podem esperar para voltar a trabalhar.

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