Como já havia sido anunciado pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), a 8.ª Turma da corte de segunda instância julgou nesta segunda-feira os embargos de declaração da defesa do ex-presidente Lula, condenado a 12 anos e um mês de prisão. Os recursos foram rejeitados por unanimidade pelos desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus – Gebran, que era o relator, concordou apenas em mudar trechos bem pontuais do acórdão, o que não alterou a decisão em si.
A decisão da corte de Porto Alegre encerra a análise do processo do tríplex do Guarujá na segunda instância. Lula segue condenado por corrupção e lavagem de dinheiro; com a conclusão desta fase, o ex-presidente já poderia ser preso, dependendo apenas de decisão do juiz Sergio Moro. Afinal, o entendimento hoje em vigor, após três julgamentos no Supremo Tribunal Federal em 2016, é o de que o início do cumprimento da pena após condenação por tribunal de segunda instância é constitucional e não viola a presunção de inocência.
Lula continua livre para realizar sua caravana pelo Sul do país, felizmente colecionando rejeição por onde passa
“Poderia” é o tempo verbal certo a usar neste caso, porque o presente “pode” não se aplica graças ao próprio Supremo Tribunal Federal. Em uma sessão surreal no último dia 22, a corte suprema deveria ter analisado um habeas corpus impetrado em benefício de Lula, mas gastou a tarde toda discutindo sua admissibilidade e, quando finalmente resolveu que a corte podia, sim, analisar o pedido, simplesmente desistiu de fazê-lo naquela ocasião, jogando para depois da Páscoa um veredito crucial para o país. O estopim do adiamento foi a alegação de Marco Aurélio Mello de que deveria pegar um voo naquela noite para participar de um evento no dia seguinte. Outros cinco ministros resolveram ser-lhe solidários, havendo entre eles quem alegasse profundo cansaço a ponto de não lhes ser mais possível discutir nada de forma coerente.
Mas a sessão do STF não foi encerrada sem que antes os ministros decidissem “compensar” sua omissão com um agrado ao réu ilustre – que, diga-se de passagem, já estava gozando do privilégio de ter seu habeas corpus colocado em pauta antes de inúmeros outros recursos idênticos de pessoas aparentemente não tão merecedoras de deferência, inclusive alguns que já estão presos. Por 6 votos a 5, Lula ganhou um “salvo-conduto”: o TRF-4 poderia até encerrar a fase de segunda instância, mas a lei não poderia ser aplicada ao ex-presidente, que pode continuar livre para realizar sua caravana pelo Sul do país, felizmente colecionando rejeição por onde passa, demonstrando que o povo de verdade – não as claques petistas e de seus movimentos-satélites – está do lado da lei e não dos criminosos.
Hélio Gomes Coelho Júnior, presidente do Instituto dos Advogados do Paraná: A República desnuda
A corte suprema, assim, está amarrando as mãos das instâncias inferiores, impedindo-as de fazer cumprir a lei, que, na prática, não se aplicará para Lula até 4 de abril, e única e exclusivamente no seu caso. A igualdade entre todos os brasileiros apregoada pela Constituição foi ignorada graças a uma decisão incompreensível de ministros do Supremo. Nunca é demais ressaltar a gravidade desse precedente: um STF que se omite e, ainda por cima, usa sua omissão como pretexto para impedir que outros tribunais atuem de acordo com o que diz a lei e o entendimento estabelecido por esse mesmo STF. Aqui, sim, vale o já clássico “nunca antes na história deste país”.