Por enquanto, prevaleceu o bom senso no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2021, enviado nesta segunda-feira pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional. Diante de um orçamento que já padece de uma série de problemas estruturais, como um engessamento de gastos que deixa ao governo margem quase nula para escolher onde investir, o governo resistiu à tentação do remédio fácil que vira veneno no futuro e manteve o respeito ao teto de gastos, apesar de toda a pressão interna e externa do bloco dos “fura-teto”. Isso significa que a despesa total do governo só poderá crescer até 2,13% no ano que vem – o menor porcentual desde a criação do teto, em 2016, consequência da baixa inflação registrada entre julho de 2019 e junho de 2020.
A PLOA considera uma previsão de receita de R$ 1,56 trilhão e gastos de R$ 1,516 trilhão – deste valor, 93,7% correspondem às despesas obrigatórias. Sobram 6,3%, ou R$ 92 bilhões, dos quais R$ 67,4 bilhões também já estão empenhados em gastos com o custeio da máquina pública, como o pagamento de contas de água e energia elétrica. De livre escolha do governo, sobraram apenas R$ 28,66 bilhões. Com isso, o investimento público federal será o menor da história, e mesmo este naco vem sendo arduamente disputado por vários ministros, o que torna ainda mais notável a disposição de se respeitar o teto de gastos em vez de abrir a torneira para satisfazer necessidades imediatas ou convicções “desenvolvimentistas” que ocupam parte da Esplanada dos Ministérios.
Se o Orçamento de 2021 não for um grito de alerta para que o governo acelere as reformas, impossível imaginar o que mais poderia estimular o senso de urgência de Bolsonaro e da equipe econômica
O mistério fica por conta da dimensão do Renda Brasil. Depois do “carrinho” em Paulo Guedes, que havia proposto o fim de outros programas considerados ineficazes, Bolsonaro havia dado a seu ministro da Economia três dias para apresentar uma nova forma de tornar possível o benefício de R$ 300 mensais. O prazo venceu na sexta-feira, sem definição alguma, e o governo decidiu incluir o Congresso nas negociações. Formalmente, evita-se o atrito entre os poderes – e são os deputados e senadores que alterarão e votarão o Orçamento de 2021 –, mas novamente o Planalto corre o risco de abrir mão do protagonismo ao não demonstrar a assertividade que se esperaria, já que o Renda Brasil foi inteiramente gestado dentro do Poder Executivo.
Se o Orçamento de 2021 não for um grito de alerta para que o governo acelere as reformas, impossível imaginar o que mais poderia estimular o senso de urgência de Bolsonaro e da equipe econômica. Romper o teto não é uma opção – a não ser que o Planalto não se importe com o retorno da inflação, dos juros altos e da desconfiança global. Sobra apenas o que Paulo Guedes chamou de “quebrar o piso”, ou seja, atacar diretamente o gasto público. O congelamento dos reajustes para servidores é apenas um alívio temporário, pois só a combinação de uma reforma administrativa ampla com medidas como desindexações e desvinculações pode reverter a trajetória do gasto público em direção ao engessamento total e ao colapso. Algumas dessas reformas já estão no Congresso, na forma das PECs Emergencial, do Pacto Federativo e dos Fundos; já a reforma administrativa continua guardada em alguma gaveta – Guedes voltou a dizer recentemente que ela está pronta para ir ao Legislativo, mas este é um caso em que o país terá de ver para crer.
Que também os parlamentares entendam a importância de manter o Orçamento de 2021 dentro dos limites legais. Qualquer perspectiva de retomada da economia pós-pandemia depende de o Brasil não abandonar a responsabilidade fiscal, mostrando que é um destino confiável e atrativo para o investimento privado, que cada vez mais tem de se tornar o protagonista e o motor do crescimento econômico – basta que o Estado proporcione as condições para isso.