O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes.| Foto: Edu Andrade/Ascom/ME
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O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), estão como os proverbiais anjo e demônio sussurrando cada um em um ouvido do presidente Jair Bolsonaro – tudo por causa do Orçamento irreal aprovado pelo Congresso Nacional e que espera a sanção presidencial. Guedes deseja que Bolsonaro vete ao menos as partes mais problemáticas do texto, e que poderiam lhe render até mesmo a acusação de crime de responsabilidade. Lira retruca dizendo que esse risco não existe, já que o dono da pauta é ele e qualquer pedido de impeachment protocolado sob a alegação de irregularidade orçamentária encontraria a gaveta ou a lata do lixo.

O texto aprovado pelo Congresso, de autoria do senador Márcio Bittar (MDB-AC), é praticamente impossível de executar. É verdade que o Ministério da Economia cometeu um erro ao não ter atualizado suas previsões de gastos quando a inflação superou as primeiras estimativas, forçando a correção do salário mínimo acima do previsto, o que elevou despesas como o pagamento de aposentadorias e pensões. Mas a função de Bittar, como relator, era corrigir as distorções, em vez de aprofundá-las. O senador quase triplicou o valor previsto para emendas parlamentares, e para isso tirou dinheiro de despesas obrigatórias. Como o governo não pode deixar de pagar tais despesas, teria de tirar dinheiro de outra categoria do Orçamento, as “despesas discricionárias”. Mas o corte seria tamanho que inviabilizaria o funcionamento da máquina pública. Um beco sem saída.

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Bolsonaro fará muito bem se ouvir seu ministro da Economia e não deixar o flanco aberto aos interessados em criar dificuldades para vender facilidades mais à frente

O caráter inviável do Orçamento ficou tão evidente que governo e Congresso estão tentando negociar soluções. Bittar já concordou em retirar R$ 10 bilhões das emendas de relator (ou seja, as “suas” emendas), mas o valor ainda está muito longe do necessário. Isso porque a legislação não permite que, em situações como esta, apenas as emendas parlamentares sejam contingenciadas – é preciso cortar valor semelhante em outras despesas. Como, pelas contas do Tesouro Nacional, o custeio da máquina pública exigirá pelo menos R$ 70 bilhões em 2021 para não haver shutdown, ainda seria preciso retirar mais R$ 23 bilhões em emendas para que o governo pudesse bloquear outras despesas sem paralisar serviços.

Se as negociações prosperarem e for possível “consertar” o Orçamento, Bolsonaro tem duas opções: vetar o texto todo para que o Congresso aprove um novo Orçamento, ou um veto parcial com o envio de um projeto de lei suplementar para realizar as correções, o que parece mais provável. Mas e se os congressistas se mostrarem irredutíveis quanto às emendas, que muitos deles veem como a chave para conquistar votos para si e para seus indicados em suas bases eleitorais?

Não vale a pena pagar para ver se Lira realmente cumpriria sua promessa de engavetar qualquer pedido de impeachment motivado pela execução de um Orçamento maquiado – o Centrão já aproveitou duas denúncias contra Michel Temer para arrancar todo tipo de concessão do então presidente da República. Há um bom tempo Paulo Guedes vem alertando para tentativas de aprovar gambiarras contábeis que colocariam Bolsonaro em situação delicada – primeiro, com os “fura-teto”; agora, com esta peça de ficção a que se chamou Lei Orçamentária Anual. Bolsonaro fará muito bem se ouvir seu ministro da Economia e não deixar o flanco aberto aos interessados em criar dificuldades para vender facilidades mais à frente. A responsabilidade fiscal é uma briga que sempre vale a pena comprar, pois um país com as contas em ordem transmite credibilidade, que por sua vez atrai investimentos, gerando emprego e renda e beneficiando especialmente os mais pobres.

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