Um provérbio popular diz que os estadistas pensam nas próximas gerações, enquanto os políticos pensam nas próximas eleições. O pano de fundo desse provérbio é que o estadista, quando toma decisões e faz reformas, pensa nos efeitos de longo prazo e na elevação do bem-estar social em caráter permanente, mesmo que sejam medidas impopulares e que não darão votos no curto prazo, enquanto o político estaria mais interessado em si mesmo, em sua carreira e na manutenção do poder, mesmo à custa de medidas demagógicas. Embora exista aí um jogo de palavras, a começar pelo fato de que todo estadista é ele próprio um político, pois é somente por meios políticos que se consegue conduzir uma nação, o provérbio serve para alertar sobre a necessidade de estadistas capazes de colocar o país no rumo do progresso permanente. O poder real somente existe quando seu detentor dispõe dos meios de ação e, no caso de uma nação, os meios estão nas veredas da política, na democracia e nas eleições.
Os desafios do Brasil exigem conhecer o cenário, ter capacidade de ler os sinais, elaborar uma estratégia e conduzir um plano de ação capaz de tirar o país do atraso e da pobreza, tarefa para a qual o país necessita de estadistas. Por onde caminhar a política e conforme o nível dos homens que vierem a ser eleitos é que se poderá ter ideia de como será o Brasil do futuro e o destino das próximas gerações. O país apresenta problemas estruturais complexos, como o baixo desempenho na economia, os elevados níveis de pobreza (mais de 50 milhões de pessoas), o grave quadro de miséria (mais de 13 milhões de brasileiros), a falência financeira do setor estatal nos três níveis (municípios, estados e União), a deficiência da infraestrutura, a elevada violência (na faixa de 60 mil homicídios por ano), o desesperador nível de desemprego e o cansaço da população com a demora em superar os graves problemas econômicos e sociais.
O setor estatal enveredou por um caminho de incapacidade financeira perigoso e profundo
Na área econômica, o atraso tem origem no esgotamento do padrão de desenvolvimento adotado nas últimas décadas, em que o Estado se apresentou como o motor do desenvolvimento, criou uma das mais altas e perversas cargas tributárias do mundo, montou uma máquina estatal disfuncional, inchada, perdulária, ineficiente, corrupta e eivada de distorções, fez uma Constituição Federal concedendo altos benefícios para seus próprios membros e prometendo direitos que não pode cumprir, mancomunou-se com segmentos do empresariado privado para pilhar o tesouro público e armou um esquema de leis que é difícil reformar.
As notícias sobre a situação calamitosa dos 5.570 municípios, 26 estados, Distrito Federal e União revelam que, mesmo recolhendo em termos efetivos 35% da renda nacional, o setor estatal enveredou por um caminho de incapacidade financeira perigoso e profundo, excluindo as honrosas exceções de praxe. Um dado pouco valorizado, sobretudo nos meios políticos, é que, em geral, os períodos de boa performance da economia brasileira contaram com a expansão da economia internacional e, coincidência ou não, os períodos de desaceleração e contração do mundo encontraram o Brasil em baixo desempenho ou recessão. Neste momento, a situação internacional não é das melhores; o mundo está cheio de conflitos políticos, a economia de muitos países está claudicante e, curiosamente, onde há enorme progresso – trazido pela revolução tecnológica – há insegurança com o futuro do emprego. As inovações, as novas descobertas e a avalanche de máquinas e robôs capazes de substituir o ser humano, inclusive em tarefas intelectuais, embora sejam realizações maravilhosas da mente humana, estão causando ebulição no mundo do trabalho e levando preocupação com a eliminação de milhões de empregos no futuro.
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As mudanças e as transformações aceleradas exigem rápida adaptação e criação de opções e novas oportunidades. O problema do Brasil é que o país insiste em desperdiçar tempo precioso lidando com problemas básicos que já foram resolvidos em todos os países desenvolvidos, a exemplo da falta de rede de esgoto tratado para quase 40% da população, baixíssimo nível educacional no ensino básico, insuficiência alimentar para larga faixa da população, déficit de moradias e precária assistência à saúde. As duas primeiras décadas do século 21 foram, se não totalmente perdidas, muito ruins em matéria de desempenho econômico, palco de confusões políticas, impeachment de uma presidente, descoberta de redes de corrupção envolvendo legiões de políticos e seus comparsas no setor privado, deterioração acelerada das finanças públicas nos três níveis da federação, enquanto os problemas estruturais não mereceram atenção e muito menos solução.
A política brasileira nada mais é que reflexo da própria nação. Apesar de os brasileiros terem rejeitado, nas últimas eleições, o projeto de poder que destruiu o país nos últimos anos, ainda temos muito a avançar em matéria de inteligência, ética e eficiência. Estamos, de fato, diante de um governo que promove reformas com efeitos de médio e longo prazo e impopulares – a da Previdência é o melhor exemplo disso –, mas as picuinhas políticas do dia a dia com muita frequência tomam o espaço que deveria ser ocupado pelos estadistas dignos do nome, tão raros, mas tão necessários para uma nação que se pretenda forte, desenvolvida e de bom padrão de bem-estar para seus cidadãos. Os desafios aí estão, aguardando os estadistas que irão enfrentá-los pelo bem do país, e não em nome de projetos de poder imediatistas.