Aos poucos ontem a frota do transporte público de Curitiba foi voltando a operar regularmente, na medida em que os salários atrasados de dezembro de cobradores e motoristas iam sendo quitados pelas empresas responsáveis. A greve que na prática paralisou a cidade na terça-feira foi apenas mais um capítulo dos problemas cíclicos do transporte público da capital. A cada dois meses, entre janeiro de 2014 e outubro de 2015, os habitantes do município viram o transporte coletivo ser alvo de greve, paralisação ou atraso. Mesmo que tudo esteja neste momento voltando à normalidade, isso não significa, nem de longe, que as dificuldades foram resolvidas definitivamente.
Todas essas ações de motoristas e cobradores foram motivadas por impasses com as empresas concessionárias do transporte público da cidade. No último episódio desta quarta-feira, as empresas justificaram o não pagamento de atrasados por conta da dificuldade de caixa que estariam sofrendo. As causas dos problemas financeiros das empresas seriam decorrentes da inflação alta, que aumenta custo de insumos, assim como da tendência de queda do número de passageiros, o que diminui a arrecadação do sistema.
A falta de transparência torna o sistema obscuro e passível desconfianças de toda ordem
É possível que já em fevereiro ocorram novos impasses no transporte público. Por força do contrato, o prefeito Gustavo Fruet deve revisar a tarifa técnica (remuneração das empresas por passageiro) até o dia 26 de fevereiro. No mesmo mês, as empresas devem reajustar os salários de motoristas e cobradores. E como a folha salarial corresponde 48% dos custos do setor, os reajustes certamente vão pressionar a revisão do valor que a prefeitura irá repassar às empresas que operam o sistema. Por decorrência lógica, ou o município subsidiará os novos custos, ou vai repassá-los para o preço da tarifa.
Atualmente a Urbs repassa às operadoras do sistema R$ 3,27 por passageiro, retendo R$ 0,03 do valor total do preço da passagem. Se projetada a inflação no reajuste de alguns insumos que pesam na composição dos custos – como combustível e pessoal – a tarifa técnica chega a pelo menos R$ 3,39, valor superior ao que hoje é cobrado como preço da passagem – R$ 3,30. Mas, se considerado também outros custos, o preço final da tarifa pode ser ainda maior. Fevereiro certamente será um mês de intensas discussões sobre a definição da tarifa de ônibus de Curitiba.
Mais que discutir o aumento da tarifa, entretanto, ou mesmo a ampliação do subsídio a fim de evitar o repasse de custos aos usuários do sistema, há um aspecto que permanece encoberto em toda essa discussão. Apesar de a Urbs receber os dados contábeis das empresas, esses dados não são abertos para escrutínio da sociedade. A Urbs não os repassa e tampouco, as empresas se dispõem a apresentá-los. O argumento corrente é que não haveria consenso de que as informações deveriam ser públicas, por se tratar de concessão pública a empresas privadas.
O resultado dessa falta de transparência, ainda que possa ser de alguma forma justificada, é que torna o sistema obscuro e passível desconfianças de toda ordem. A sociedade, em especial sua parcela organizada, fica incapaz de debater os itens que constam nas planilhas de custos e os valores a eles atribuídos. O sistema, portanto, acaba se tornando blindado a discussões, críticas e propostas alternativas, algo avesso ao princípio democrático.
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