O presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan, diante das dificuldades para enquadrar os gastos do governo e equilibrar as contas durante a crise dos anos 80, desabafou dizendo: “O governo é o problema, não a solução”. A frase pode ser um pouco exagerada, mas reflete o que tem sido o setor público ao redor do mundo nas últimas décadas. Dada a maneira como as sociedades se organizam, o Estado é necessário, e não é o caso de pregar a ausência do poder estatal de forma indiscriminada, mas sua atuação deve ser limitada à provisão de soluções que a sociedade não consegue fornecer por si própria. Trata-se de saber por que, onde e como o governo é necessário e qual o melhor formato de estrutura para que as tarefas do Estado sejam cumpridas.
A criação e a operação de superestruturas de poder complexas derivam, em primeiro lugar, da necessidade de oferecer segurança e proteção à população diante de eventos e fontes de sofrimento que superam a capacidade individual e mesmo coletiva de resistência, a exemplo de agressões externas ao país, violência social e catástrofes naturais. Em segundo lugar, o Estado é útil para prover bens coletivos, cujo suprimento por ação individual ou da comunidade é bastante difícil, como a administração de um poder judicial e dos equipamentos urbanos de uso comum: avenidas, ruas, limpeza da cidade etc. Para aquilo que indivíduos e a sociedade organizada não consigam solucionar, as pessoas devem abrir mão de parte de sua liberdade e consentir em se submeter a um poder instituído, o Estado, sempre dentro dos parâmetros delineados pelo princípio da subsidiariedade.
O mercado tem mecanismos para o saneamento de falhas privadas, mas as falhas estatais vêm se tornando crônicas
Os problemas começam quando o Estado se torna um monstro, eivado de ineficiência e corrupção, forçando a sociedade a criar mecanismos para domar o monstro estatal, transformado ele próprio em fonte potencial de ameaça. A situação que o Brasil está vivendo não se restringe a uma grande recessão e falência financeira dos municípios, estados e União, com seus déficits gigantescos, ineficiência elevada e desvios de dinheiro público. A situação é mais grave, pois o poder estatal e suas estruturas vivem criando fórmulas para transferir cada vez mais parcelas do patrimônio, produto e renda da sociedade para o setor público, sem que este se disponha a reduzir seu tamanho, diminuir suas burocracias, reduzir seus salários médios, conter o inchaço da máquina e suprimir desperdícios.
O mesmo Estado que está correndo atrás de meios para aumentar a arrecadação tributária – com mais sacrifícios sobre uma população já castigada por brutal recessão e alto desemprego – não tem sido capaz de enfrentar seu excessivo tamanho e a bagunça financeira que tomou conta dos governos em todos os níveis. É bom lembrar que não se trata de um problema dos governos atuais; é uma situação crônica do setor estatal brasileiro que, mesmo em crise profunda, não reformula suas estruturas e seus privilégios, e quando o faz é de forma tímida. O Estado é necessário, sim, naquilo que escapa à capacidade de solução por ação das instâncias inferiores, mas precisa de limites e controles sobre seus poderes e suas estruturas. O poder constituído não pode tudo, mesmo porque, se deixado livre e sem controle pela sociedade, o Estado se esmera na criação de burocracias, benefícios e privilégios a seus políticos e suas corporações funcionais, descamba para a corrupção, presta maus serviços e cobra impostos altíssimos.
Nossas convicções: O princípio da subsidiariedade: menos Estado e mais cidadão
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No momento em que a deterioração econômica, política e moral do Estado brasileiro atingiu níveis elevados, o anúncio de medidas de privatização de empresas estatais e liberação de algumas atividades para a iniciativa privada é louvável. Por óbvio, o setor privado também tem defeitos, mas seus erros e sua ineficiência, sobretudo se não atender bem ao consumidor, acabam em prejuízo e falência. O mercado tem mecanismos para o saneamento de falhas privadas, mas as falhas estatais vêm se tornando crônicas. No fim, a população paga a conta e o indivíduo é sufocado pelo poder que ele constituiu para defendê-lo.
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