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Editorial

Os protestos no Islã

As manifestações que se estendem pelos países de cultura islâmica contra charges publicadas por jornais europeus, consideradas ofensivas à religião revelada por Maomé, ganham características de confronto com o Ocidente. Os protestos dos grupos fundamentalistas vão além do questionamento da liberdade de expressão, para extravasar ressentimentos acumulados por décadas de desencontros entre povos ocidentais e os habitantes do arco muçulmano.

De fato, os desenhos originalmente publicados pelo jornal dinamarquês Jylland Posten, em setembro passado, foram reproduzidos em outros jornais europeus com o propósito de resistirem à onda fundamentalista, após as acusações de ofensa religiosa externadas por lideranças do Islã. Essa segunda rodada de publicações elevou a tensão entre a comunidade islamizada em países que vão do Norte da África até o Oceano Índico, com foco na Península Arábica. Num primeiro momento acreditou-se que os protestos perderiam vigor, mas as turbulências se prolongam por duas semanas e ganham intensidade a cada dia: primeiro, houve boicote a produtos de firmas escandinavas; no fim de semana, representações diplomáticas da Dinamarca foram incendiadas em capitais árabes; ontem, manifestantes desafiaram forças de segurança e escritórios da ONU no Afeganistão, ocasionando mortes.

Os governos europeus estão num dilema: enquanto alguns criticam a publicação daqueles desenhos, outros se recusam a intervir no que consideram direito de expressão livre. De fato, a liberdade que ancora a atividade da imprensa é um dos valores da evolução cultural trazida pelo iluminismo, compondo um dos fundamentos da modernidade ocidental. Porém, outras civilizações subordinam tal liberdade de expressão a padrões considerados igualmente relevantes, como – para os povos islâmicos – os sentimentos religiosos, entre eles o que proíbe a reprodução da imagem do profeta Maomé.

Contudo, naquelas manifestações os analistas enxergam outras motivações além da questão imediata de ofensa à religião – situação reconhecida inclusive por membros de entidades islâmicas estabelecidas no Paraná. Problemas locais no Líbano estimularam o ataque à embaixada da Dinamarca, bem como na Faixa de Gaza e no Afeganistão. É que tais países e regiões enfrentam o que um líder árabe paranaense qualificou de "acúmulo de opressão ao povo muçulmano".

De fato, tal como povos em outros continentes, os habitantes do Oriente islâmico não favorecidos pela riqueza do petróleo sofrem um retardo de evolução que se traduz por pobreza e instabilidade derivada de governos temporários e onde valores democráticos são vistos com suspeição. Nessas áreas a tentativa de transição para regimes não autoritários resulta em erigir a mesquita como centro de poder, ampliando o distanciamento. Evitar que tais diferenças culturais degenerem em choque de civilizações é um desafio a ser superado com uma abordagem inteligente e cuidadosa, para garantir a vida em comum dos membros da comunidade humana.

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