O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou o primeiro pacote fiscal do governo Lula e, de saída, eivado de fome por mais impostos. A estrutura tributária brasileira carrega, entre outros, três defeitos que inibem o crescimento econômico. O primeiro é justamente o tamanho da carga de tributos sobre os ombros da sociedade produtiva – pessoas e empresas –, que já atinge 34% do Produto Interno Bruto (PIB) em forma de carga efetivamente arrecadada. Considerando que há renúncias fiscais oficiais, sonegação e inadimplência, a carga tributária nominal supera 40% do PIB.
O segundo defeito é o excesso de impostos, contribuições e taxas (elementos que compõem o conjunto chamado “tributos”) e a enorme complexidade legal e regulatória, que levam os contribuintes a suportarem, além do alta carga, elevados custos burocráticos de obediência. O terceiro defeito é a má distribuição dos tributos sobre os grupos de bens e serviços produzidos, situação essa piorada pela política de renúncias fiscais sobre setores específicos, como já ocorreu com as isenções de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) ao setor automotivo e produtos da linha branca, basicamente os eletrodomésticos.
O pacote fiscal apresentado pelo ministro Haddad no primeiro mês do governo contém medidas que elevam os tributos sem que seja evocada qualquer medida de racionalização e redução de despesas.
No ano de 2010, último do segundo mandato de Lula, as contas públicas estavam em má situação, o déficit era alto, os efeitos retardados da crise financeira mundial começavam a ser sentidos no Brasil e o ministro da Fazenda da época, Guido Mantega, negava que o governo estivesse cogitando aumentar tributos e dizia que a solução para a piora das contas do governo era o crescimento econômico. Por óbvio, a arrecadação tributária aumenta quando o PIB cresce, porém, o crescimento não se faz por força de mágicas e, mesmo diante de políticas corretas, não há crescimento expressivo no curto prazo. Já naquela época, Lula em seu segundo mandato não se comprometeu com algo que famílias e empresas fazem quando entram em déficits: racionalizam e reduzem gastos.
Pode-se argumentar que a lógica do governo apresenta certas diferenças em relação à lógica familiar e empresarial, pois a ação do governo tem efeitos grandes e pesados sobre a economia nacional, no mínimo pelo tamanho do setor estatal. Mas também se pode argumentar que famílias e empresas resolvem seus problemas por sua realidade financeira interna, enquanto o governo joga seus déficits sobre os ombros da sociedade, seja aumentando tributos, fazendo dívida ou emitindo moeda. Por isso, é sempre recomendável que, quando o governo entra em déficit, sejam examinados os gastos públicos, desperdícios e ineficiências, a fim de tentar racionalização e redução seletiva dos gastos.
Porém, assim como Lula e Mantega não se comprometeram com redução de gastos públicos lá em 2010, Lula e Haddad hoje não disseram uma palavra sobre cortes, redução ou racionalização de gastos. Pelo contrário, antes mesmo de assumir, ainda durante a campanha eleitoral, o governo atual já havia anunciado aumento da máquina estatal e inchaço da burocracia pública, com claro aumento de gastos. Pois o pacote fiscal apresentado pelo ministro Haddad no primeiro mês do governo contém medidas que elevam os tributos sem que seja evocada qualquer medida de racionalização e redução de despesas, e também nada ficou claro sobre eventual revisão das renúncias fiscais (isenções tributárias a determinados setores e produtos) que o PT vinha criticando.
Pelos sinais genéricos emitidos pelo governo, a fome por mais tributos manifestada por autoridades econômicas prenuncia que a mordida sobre a sociedade não vai parar no primeiro pacote de Haddad. Mais tributos virão por aí, sempre em nome de um discurso sobre justiça fiscal nunca explicada por critérios técnicos e científicos. Se a estrutura tributária brasileira, com sua complexidade e excessivo número de tributos, é uma espécie de monstro tributário, também é certo que o tamanho da carga e a confusão de leis e normas agem contra o objetivo de fazer o PIB crescer. Em todos os estudos feitos no exterior, especialmente por organismos oficiais e casas de análises, sobre as causas que dificultam o crescimento econômico brasileiro, aparecem sempre nas primeiras posições a alta carga tributária e o complexo sistema fiscal vigente no país.
Outro aspecto que ajuda a manter o país com elevado índice de pobreza e alta desigualdade de renda é a forma como os aumentos de tributos têm sido distribuídos no lado dos gastos. Prevalece um nocivo sistema de captura dos tributos por categorias de funcionários, políticos e burocratas nos Três Poderes, que estão longe de representar as classes de renda baixa. Há sim certas faixas de baixos salários no sistema estatal – a exemplo de policiais e professores da educação básica –, porém, a captura de recursos públicos e de elevação de arrecadação por categorias privilegiadas incrustadas no Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário agem para impedir que aumentos tributários nunca amenizem na mesma proporção de seus valores as mazelas sociais brasileiras. O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão técnico do governo federal, já demonstrou por meio de estudos que um dos obstáculos à redução das desigualdades no Brasil é a estrutura de gastos públicos.
É necessário haver tributos para sustentar a estrutura de governo e os programas públicos aceitos pela população e aprovados nas casas de representantes do povo, porém sem descuidar para o sistema tributário tenha o menor número possível de defeitos e vícios, principalmente para não ser um obstáculo ao crescimento econômico e ao desenvolvimento social. No Brasil, com carga tributária efetivamente arrecadada de 34% do PIB (que, como já dito, faz a carga nominal total ser muito maior que isso em razão de isenções, sonegações e inadimplência), o prejuízo do sistema tributário sobre o crescimento econômico já está dado, com o agravante de que o cipoal de leis e regulamentos no âmbito da União, estados e municípios responde por milhões de ações judiciais que emperram a Justiça e ajudam a inibir o espírito de iniciativa empreendedora.
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