Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
editorial 1

Para o fim da impunidade

O fim da prerrogativa de foro voltou à pauta de discussões depois que a corregedora do Conselho Nacional de Justiça, Eliana Calmon, e dirigentes de entidades representativas de juízes, procuradores da República e da sociedade defenderam publicamente a necessidade de acabar com o que consideram um privilégio concedido a autoridades. O principal argumento gira em torno da dificuldade que os tribunais têm para realizar a instrução dos processos, prolongando em excesso as disputas judiciais e, muitas vezes, conduz à falta de punição de políticos. As discussões teóricas a respeito do problema ocorrem há anos, mas é fundamental uma mudança de perspectiva na discussão. Em vez de acalorados debates sobre o fim, ou a manutenção, da prerrogativa de foro, deve-se concentrar no enfrentamento do ponto central da questão – a impunidade.

O foro por prerrogativa de função – mais conhecido como foro privilegiado – permite que autoridades públicas sejam julgadas diretamente por um órgão colegiado de magistrados. Assim, deputados federais e senadores, por exemplo, são julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), enquanto governadores, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Já deputados estaduais, pelos tribunais de Justiça dos estados. Caso os processos tramitassem rapidamente, chegando-se a uma conclusão em tempo razoável, com punição de culpados e absolvição de inocentes, não se veria problema algum no instituto do foro por prerrogativa de função.

Mas a realidade mostra que os tribunais não são órgãos preparados para conduzir processos da mesma forma que os juízos de primeira instância. Isso está bastante claro no caso do trâmite da denúncia do mensalão, que tramita há quase sete anos no STF. Até agora o processo não foi a julgamento. O caso mensalão, entretanto, não é isolado. Conforme levantamento feito pela Folha de S. Paulo, divulgado no dia 25 de fevereiro, no qual se analisou 258 processos, as ações que tramitam no STF contra políticos se arrastam por mais de dez anos sem julgamento. A pesquisa mostra também que inquéritos envolvendo políticos demoram o dobro do tempo médio para se chegar a uma conclusão. Esses fatos servem de alerta, pois há o risco de prescrição dos ilícitos investigados.

Falta aos tribunais estrutura para atender a um número de processos que cresce vertiginosamente. Além disso, não faz parte da rotina das cortes a realização da instrução processual, ouvindo testemunhas e depoimento das partes. Com o julgamento na primeira instância, dizem os defensores do fim do foro privilegiado, esses problemas seriam corrigidos.

Entretanto, novos problemas apareceriam. Os políticos investigados ou denunciados poderiam tentar exercer pressões sobre os juízes de primeira instância, a fim de influir no resultado do julgamento. Isso levaria a novos tipos de injustiças e impunidades.

Portanto, há necessidade de se buscar uma reforma do ordenamento jurídico contra a falta de punição da classe política. E essa solução independe do banimento, ou não, do foro por prerrogativa de função. O que se precisa ter em mente é: caso se entenda pelo fim do foro privilegiado, deve-se aparelhar as instituições com o objetivo de impedir que os denunciados possam pressionar os magistrados de primeiro grau. De outro lado, caso se entenda pela manutenção do instituto, deve-se implantar uma estrutura nos tribunais que permita a rápida instrução processual. Qualquer que seja o caminho, é preciso deixar posições teóricas, cujo debate acaba não tendo uma finalidade prática, e concentrar a atenção nos fins do processo, pois só haverá justiça se o Poder Judiciário puder ser célere e acabar com a impunidade.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.