Os números não mentem: não há dúvidas de que o maior problema do Paraná, hoje, é o da segurança pública. Tudo é remediável, menos a morte pela violência. A preocupação com os filhos quando saem de casa para a escola e o lazer atormenta dia e noite as famílias paranaenses. O medo com o envolvimento de pessoas queridas com as gangues, a droga e o tráfico é como se fosse uma ferida à flor da pele, incurável. A transformação de residências e prédios em fortalezas, envoltas em cercas elétricas, dá a impressão de que os paranaenses, especialmente das grandes cidades, vivem em uma guerra não declarada, onde o inimigo sem rosto, mas violento e pronto para matar, surge à espreita a qualquer hora.
Esse é o triste cenário que vemos hoje no Paraná. Embora seja quase o mesmo de todo o Brasil, é muito mais sério do que a maioria dos estados. Quem confirma é o estudo "Mapa da Violência 2010 Anatomia dos Homicídios no Brasil", divulgado na última terça-feira, pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, do Instituto Sangari. Baseado em dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, a pesquisa mostra que o Paraná subiu da 14.ª para a 9.ª posição entre os estados com mais homicídios, entre 1997 e 2007. O que representa, no período, um crescimento de 70% na taxa de mortes violentas. Somente em 2007 foram assassinadas 3.112 pessoas no Paraná, média de oito por dia. Em dez anos, o número de homicídios alcançou a preocupante cifra de 25,5 mil em todo o estado.
A situação é tão grave que três municípios paranaenses estão no ranking das dez cidades brasileiras que apresentam as maiores taxas de homicídio, em 2007. E o pior: são duas cidades pequenas e uma de porte médio, onde há uma década a vida era tranquila. São elas: Nova Tebas, na região central; Guaíra, no Oeste; e Tunas do Paraná, na região metropolitana de Curitiba. Essas cidades, em termos de assassinatos em relação ao total da população, estão à frente das capitais do Sudeste, São Paulo e Rio de Janeiro. Nova Tebas apresenta taxa de homicídios de 132 por 100 mil habitantes; em Guaíra, o índice é 106,6; e em Tunas do Paraná é 99. Para efeitos de comparação, a taxa de Curitiba é de 45,5 homicídios para 100 mil habitantes.
As causas da violência no Paraná são praticamente as mesmas registradas em todo o Brasil. O sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz explica que "na história recente da violência que resulta em homicídio, no Brasil, é a história do crescimento dessa violência entre jovens", sendo que "uma não terá solução sem a outra". Nessa linha, o estudo mostra que, desde 1980, a violência continua crescendo entre os jovens brasileiros. Se a cada 100 mil jovens (entre 15 e 24 anos) 30 deles morriam por homicídio em 1980, o número saltou para 50,1 em 2007.
Da perda da vida pelos jovens, portanto, é que sai a estatística de que 512,2 mil pessoas morreram no país vítimas de homicídio, entre 1997 e 2007. Além disso, de acordo com o Mapa da Violência, em mais de 90% desses casos de homicídio as vítimas eram homens e os mais atingidos foram os negros. Se em 2002 morriam 46% mais negros do que brancos, em 2007 a proporção cresceu para 108%.
A pesquisa mostra outro dado importante: a gradativa migração da violência, a partir do início dos anos 2000, dos grandes centros para o interior. Onde, como foi possível ver, não escapam as pequenas cidades. A taxa de homicídios no interior do país cresceu de 13,5 (a cada 100 mil) em 1997 para 18,5 em 2007. A rigor, o fenômeno da "interiorização da violência" não deixa mais ninguém seguro em qualquer lugar do país.
Se os nossos estados vizinhos, como Rio Grande do Sul e Santa Catarina, não estão no topo deste ranking (o primeiro ocupa o vigésimo lugar e o segundo é um dos menos violentos do país) e, considerando que as condições sociais são praticamente as mesmas no Sul, algo está muito errado no Paraná, em termos de segurança pública. Embora as causas da violência sejam mais amplas, fica visível a olho nu a deficiência do aparato de segurança no estado: o número de policiais militares e civis é insuficiente; muitos equipamentos policiais estão sucateados, como é o caso da frota de veículos; as delegacias, além de superlotadas, estão em péssimas condições.
A secretaria paranaense da área questionou a metodologia utilizada na pesquisa, alegando que os dados fornecidos pelas cidades, por meio do sistema do Ministério da Saúde, não refletem a realidade. "O próprio Ministério da Justiça acredita que para haver a comparação através de ranking é preciso criar um banco de dados criminal único em todos os estados para que só a partir deste momento seja estabelecido um ranking da criminalidade", informou em nota oficial a Secretaria da Segurança Pública.
De qualquer forma, esta hora em que muitos governantes estão deixando seus cargos para concorrer a novos mandatos, nas eleições deste ano, parece ser o momento mais oportuno para se iniciar um grande debate de reavaliação da segurança pública do Paraná, diante deste lamentável quadro. E, especialmente, de ampliação efetiva das políticas públicas e ações sociais para dar futuro aos jovens e afastá-los da violência.