Em sua primeira passagem pelo Planalto, o petismo depredou a Petrobras de todas as formas possíveis: corrupção pura e simples, políticas populistas de preços que trouxeram prejuízos bilionários, e decisões de negócio desastrosas. Nos governos que sucederam Dilma Rousseff, a estatal lançou um plano de reconstrução que incluía, além do saneamento financeiro da empresa, uma priorização das atividades de exploração e produção, que a Petrobras realiza muito bem e são mais lucrativas, enquanto ativos de outros setores, especialmente o refino, seriam vendidos. Mas o PT está de volta, e de imediato se dispôs a reverter o plano levado adiante sob Michel Temer e Jair Bolsonaro. Para isso, não basta interromper as vendas ainda não realizadas; é preciso tomar de volta o que já foi vendido, por bem – como na tentativa de recomprar do fundo Mubadala a refinaria de Mataripe, na Bahia – ou por mal, como acaba de descobrir um consórcio que pretendia receber a Refinaria Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor), no Ceará, a principal produtora de asfalto do Nordeste e uma das maiores do país.
Em 2022, ainda no governo Bolsonaro, o consórcio Grepar, também especializado em asfalto, acertou a compra da Lubnor por US$ 34 milhões. A operação recebeu o aval do Conselho Administrativo de Defesa Econômica em junho deste ano, e o Grepar pagou a primeira parcela, de 10% do valor total. Gastou outros US$ 10 milhões em estudos e consultorias para poder operar a unidade. Planejou contratações e previa investir, no total, US$ 100 milhões. Mas, na segunda-feira, a Petrobras informou que o negócio estava desfeito. Em um burocratês obscuro, o comunicado se limitava a dizer que a razão havia sido a “ausência de cumprimento de Condições Precedentes nele estabelecidas até o Prazo Final definido em tal contrato (25/11/2023), em que pesem os melhores esforços empreendidos pela Petrobras para conclusão da transação”.
O governo e a atual direção da Petrobras não se importam em jogar de volta na lama o bom nome que a estatal vinha se empenhando em recuperar desde 2016. Em nome do estatismo, vale até mesmo romper um contrato já assinado
As tais “condições” eram a solução de uma controvérsia fundiária sobre a posse do terreno onde fica a Lubnor. Parte dele pertencia à União, que já havia repassado a terra em outorga, e uma outra parte é da prefeitura de Fortaleza. A Petrobras alegava não poder entregar a refinaria sem resolver a compra da terra, mas não fez isso, mesmo que já houvesse entendimento quanto ao preço a pagar, e que o único óbice imposto pela prefeitura para o negócio – a necessidade de aprovação do Cade – já tivesse sido removido. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o empresário Clovis Fernando Greca afirmou estar disposto a receber a Lubnor da forma como estava e comprar ele mesmo o terreno para encerrar de vez a questão – a solução já tinha sido aceita pela prefeitura, mas a Petrobras não concordou.
Em outras palavras, a Petrobras fez corpo mole e recusou outras soluções contratualmente possíveis até que expirasse o prazo contratual, anulando-se tudo o que fora acertado. “Ela [Petrobras] simplesmente desistiu. Desistiu de fazer negócio, de um contrato no qual não pode ter desistência. Ela não decidiu fazer isso agora. Decidiu quando um novo governo assumiu. O propósito era desfazer o contrato”, disse Clovis Greca ao Estadão. Quanto aos “melhores esforços empreendidos pela Petrobras para a conclusão da transação”, o empresário foi claro: “O pessoal da Petrobras, de níveis inferiores, estava fazendo o que precisava acontecer. Mas a direção da empresa já havia decidido que não iria finalizar o negócio”.
O governo e a atual direção da Petrobras, portanto, não se importam em jogar de volta na lama o bom nome que a estatal vinha se empenhando em recuperar desde o segundo semestre de 2016. Em nome do estatismo, vale até mesmo romper um contrato já assinado – se não do ponto de vista estritamente legal, pois a frieza técnica dirá que houve apenas uma expiração por falta de cumprimento de certas condições, certamente o é do ponto de vista moral, pois esse descumprimento foi deliberado, de forma a inviabilizar o acordo já feito. Um procedimento típico de repúblicas bananeiras.
Clovis Greca não irá apenas pedir indenização na Justiça; na entrevista ao Estadão, ele também prometeu deixar de investir no Brasil. “Vou investir em outros lugares, que queiram ter empresariado com investimentos sérios, de gente que quer construir algo”, afirmou. Não se trata, afinal, de simplesmente parar de assinar contratos com o Estado, mas de evitar todo um ordenamento legal e judicial ainda bastante hostil ao empreendedor. Não há como reprová-lo pela desilusão após levar uma rasteira como essa. Se “o Brasil voltou”, como diz o slogan petista, a Petrobras também voltou às mesmas práticas que arruinaram sua credibilidade no passado. No entanto, é inútil esperar que, após sujar o nome, uma Petrobras que é capaz desse tipo de artimanha já não encontre ninguém disposto a fazer negócio com ela; o passado e a Operação Lava Jato mostraram que, infelizmente, há muitos ainda interessados em dançar conforme aquela música que, ao menos por algum tempo, o Brasil sonhou ter ficado fora de moda.
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