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 | Henry Milleo/Gazeta do Povo
| Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo

Às vésperas do Fórum Econômico Mundial, na cidade suíça de Davos, a ONG britânica Oxfam divulgou um relatório mostrando que apenas oito bilionários – Bill Gates, fundador da Microsoft; Amancio Ortega, dono da Zara; Warren Buffett, megainvestidor; Carlos Slim, magnata das telecomunicações; Jeff Bezos, fundador da Amazon; Mark Zuckerberg, fundador do Facebook; Larry Ellison, diretor-executivo da Oracle; e Michael Bloomberg, empresário e ex-prefeito de Nova York – têm mais dinheiro que a metade mais pobre de toda a população mundial. O objetivo do estudo, que já foi feito em outras ocasiões, é chamar a atenção para a desigualdade no momento em que alguns dos principais atores da economia mundial se reúnem – o estudo completo foi apresentado no Fórum, mas partes dele foram publicadas antes do evento para mobilizar a opinião pública.

A metodologia usada pela Oxfam já foi questionada por diversos ângulos: entre outros problemas, ela desconsideraria a riqueza informal, não declarada (como imóveis sem registro); e criaria distorções ao usar como definição de riqueza um conceito de “patrimônio menos dívidas”, o que colocaria entre os mais pobres qualquer um, ainda que de classe média ou alta, com financiamentos que superem sua renda ou patrimônio. Quando da publicação da versão 2016 desse mesmo estudo, a revista The Economist lembrou que, globalmente, a desigualdade vem caindo – a preocupação deveria ser com os países onde ela cresce. Independentemente disso tudo, é um fato que há pessoas vivendo com fortunas inimagináveis ao cidadão comum enquanto há muitos na miséria completa. A questão é: o que fazer com essa informação?

A obrigação moral de que os ricos ajudem os pobres é um preceito milenar, mas que se perdeu

“Desigualdade”, em si, é um conceito escorregadio. Para usar um exemplo extremo, países onde todos são miseráveis são menos desiguais que países prósperos, mas onde há ricos e pobres. Nem por isso deveríamos ver aqueles como um ideal a ser buscado – por mais que os socialistas se esforcem nesse sentido, criando miséria generalizada (exceto para os burocratas da elite dirigente) por onde passam. Isso nos leva a refletir se é prioritário combater a desigualdade ou a pobreza – essa escolha é que balizará quais políticas públicas um país colocará em prática.

Uma reação comum ao estudo da Oxfam é considerar imoral que existam Zuckerbergs e Bloombergs enquanto há milhões de miseráveis. Mas a verdadeira imoralidade é a mera existência de milhões de miseráveis – independentemente da existência de bilionários – e é no combate à pobreza que sociedade e poder público deveriam se engajar com mais força, inclusive com a participação dos mais ricos. A obrigação moral de que os membros mais prósperos de uma sociedade trabalhem para aliviar o sofrimento dos pobres é um preceito milenar, mas que infelizmente se perdeu nos últimos tempos – não sem culpa daqueles governantes que se dispuseram a tomar para si todo o trabalho de assistência social, amortecendo as consciências e levando o cidadão a pensar que os pobres são problema do Estado, e é para o Estado ajudá-los que se paga impostos.

No entanto, é tentador olhar para estudos como o da Oxfam e transformar uma obrigação moral em obrigação legal, como sugerem Thomas Piketty e outros economistas. Uma sociedade que optasse por isso estaria dizendo às pessoas que elas só podem prosperar até certo ponto; dali em diante, seu patrimônio é imoral (não importando como foi conquistado) e nem deveria lhe pertencer. É fácil imaginar como esse tipo de política amordaçaria o espírito empreendedor e a inovação que criam riqueza – riqueza esta, aliás, que não beneficia apenas um indivíduo, mas toda uma coletividade, por exemplo ao gerar empregos, melhorar a produtividade e promover desenvolvimento. Tolher, em nome do combate à desigualdade, essa criação de riqueza só porque ela fará alguns poucos milionários é mirar no problema errado e perpetuar o problema. Já numa sociedade que realmente priorize a luta contra a pobreza, elimine a miséria e dê condições para que todos possam prosperar, pouco importará o número dos muito ricos.

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