Uma prática danosa ao desenvolvimento da América Latina é a mania de políticos, sindicalistas e intelectuais de achar que todo problema de gestão pública comporta decisão ideológica. Desde a direção dos gastos públicos – se mais investimento ou mais programas sociais, assunto no qual cabe, sim, opção ideológica – até a decisão sobre que material usar em uma ponte, assunto em que não deveria entrar qualquer consideração ideológica, tudo passa pelo embate entre esquerda e direita, socialismo e capitalismo, liberal ou estatizante.
Há longa lista de assuntos de Estado em que é cabível mudar as opções conforme a ideologia adotada. Entretanto, há outros temas em que as decisões devem ser tomadas a partir apenas e tão somente de aspectos técnicos e econômicos. A ideologização de rigorosamente tudo o que se faz na gestão dos negócios públicos é nefasta, leva a escolhas ruins para a população e prejudica o desenvolvimento nacional. No Brasil, a quantidade de erros prejudiciais ao país por causa do tratamento ideológico de inúmeras escolhas é enorme.
Na era lulodilmista, o ranço ideológico voltou, em áreas nas quais nunca deveria ter entrado
Um exemplo foi a famigerada Política Nacional de Informática, de triste memória, que condenou o Brasil ao atraso e à estagnação na área, principalmente a partir de 1979, com a criação da Secretaria Especial de Informática (SEI), até 1991, quando o presidente Fernando Collor sepultou aquela que foi uma das piores políticas adotadas no país. Por essa lei, era proibida a importação de computadores, os produtores estrangeiros não podiam produzir no Brasil e era proibido mesmo aos produtores nacionais importar componentes eletrônicos e tecnologia estrangeira. Tudo isso foi feito sob o argumento – sedutor tanto para os militares nacionalistas quanto para a esquerda protecionista – segundo o qual o Brasil deveria ter sua própria tecnologia genuinamente nacional.
O segundo exemplo de dano causado por uma política irracional implantada em função de ideologia anticapitalista foi a constituição de brutal dívida externa entre os anos 50 e os anos 80, decorrente, entre outros fatores, da decisão de fazer importações de petróleo (sem ter dinheiro para pagar) e rejeitar investimentos estrangeiros no setor, em nome de um monopólio ideológico nocivo à nação. Em outra convergência entre nacionalismo e esquerdismo, alegava-se que permitir investimentos de empresas internacionais especializadas na prospecção e extração de petróleo seria colocar a soberania nacional em risco, quando o risco maior é ficar na dependência de suprimentos externos – ou seja, submetido à boa vontade dos fornecedores internacionais – e dos bancos estrangeiros para obter empréstimos e pagar as importações.
O Brasil nunca conseguiu incorporar o pragmatismo – corpo de ideias que julga a validade de uma política por seu bom êxito prático – nem mesmo em assuntos que devem ficar longe do embate ideológico. A política de informática mostrou-se um desastre total, e a insanidade foi tanta que a SEI era um órgão vinculado ao Conselho de Segurança Nacional, apesar de a política de informática ser assunto mais ligado ao campo da ciência e tecnologia.
Na era lulodilmista, o ranço ideológico voltou, em áreas nas quais nunca deveria ter entrado: a produção de sondas petrolíferas e a exploração de petróleo na camada do pré-sal, casos em que os prejuízos causados por políticas eivadas de ideologia foram gigantescos. Em plena segunda década do século 21, é imperioso que critérios técnicos tenham mais peso nas decisões de governo, sobretudo após o desastre dos regimes de esquerda e da constatação de que o protecionismo que isola o país do resto do mundo é um desastre justamente para aqueles que os ideólogos dizem defender: os pobres.
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