Se fosse feita compilação dos discursos de todos os candidatos a prefeito e a vereador, e houvesse classificação por assunto, seguramente as propostas para eliminar a pobreza e o desemprego estariam, em termos de quantidade, no topo dos temas abordados. Como intenção, nada há de errado em um candidato dizer que vai trabalhar para reduzir a pobreza e criar empregos em seu município, sobretudo se ele explicitar com que meios pretende cumprir a proposta – coisa que ou não fazem ou, quando fazem, prometem ações e atos fora de seu alcance.
Essa prática se repete em todas as campanhas eleitorais para governador, deputado estadual, deputado federal, senador e presidente da República. Embora os meios de ação de um presidente sejam maiores que os meios à disposição de um parlamentar, mesmo em eleições presidenciais os candidatos fazem promessas sabidamente impossíveis de cumprir. Quando trazido para o âmbito das eleições municipais, o hábito de prometer o que está fora do alcance de um vereador ou de um prefeito tem transformado as campanhas em rosários de falatórios vazios, sem credibilidade perante a população. No fundo, tudo se resume a dizer qualquer coisa que seja julgada útil para atrair votos.
O respeito e a responsabilidade com que se trata um problema devem corresponder à dimensão de sua gravidade para o padrão de bem-estar social da população
Estranhamente, sem saber se isso garante ou não a conquista de votos, tornou-se hábito de candidatos a prefeito e a vereador a insistência em fazer promessas de superar a pobreza e o desemprego, que são flagelos sociais graves do Brasil. A julgar pelas promessas e propostas, a dimensão dada pelos candidatos ao problema da construção de uma quadra esportiva é a mesma dada ao problema do combate à pobreza ou o desemprego. A consequência negativa disso é que, colocando tudo no mesmo nível, os males da pobreza e do desemprego perdem significância e passam a compor a galeria dos dramas menores e corriqueiros de uma administração, quando em realidade se constituem nos mais dramáticos flagelos sociais, e que estão entre os mais difíceis de solucionar. Praticamente todos gostariam de ver a pobreza e o desemprego desaparecerem de vez da vida nacional; se isso é verdade e se todos os eleitos prometem a mesma coisa, é o caso de indagar por quais razões, afinal, esses males ainda não foram eliminados.
É importante que governo e sociedade tomem consciência da gravidade desses dois problemas sociais e que os mantenham na pauta de debates públicos, como meio de colocá-los no topo das prioridades nacionais e como uma das razões principais da existência de governo. Mas o respeito e a responsabilidade com que se trata um problema devem corresponder à dimensão de sua gravidade para o padrão de bem-estar social da população. E, no caso da pobreza e do desemprego, a razão primeira da política econômica e das ações de governo deve ser construir os meios que levem à redução desses males. Sabidamente, a mais eficiente arma para melhorar os indicadores tanto da pobreza quanto do desemprego é o crescimento econômico, medido pelo aumento do Produto Interno Bruto (PIB).
O PIB tem um valor monetário equivalente à expressão monetária da totalidade dos bens e serviços finais produzidos, e é uma identidade matemática com o valor da renda nacional. O aumento do PIB (bens e serviços de consumo e bens de capital) é exatamente igual ao aumento da renda nacional (salários, aluguéis, juros e lucros). Assim, o crescimento do PIB significa aumento equivalente da renda nacional, e esta, por sua vez, reflete a redução do desemprego e o aumento da renda por pessoa, desde que o aumento populacional no ano não seja superior à taxa de crescimento do PIB. O crescimento econômico levanta, também, a arrecadação tributária do governo nos municípios, estados e União, o que contribui para pagar parte das promessas dos candidatos que forem executadas.
É grave nos costumes políticos brasileiros a inclinação dos candidatos a se apresentarem sempre como bons samaritanos que vão lutar para distribuir mais bens e serviços públicos a favor dos mais necessitados. O bom samaritano extrapolou a parábola bíblica para se tornar sinônimo de alguém extremamente preocupado com os outros, sempre disposto a trabalhar a favor do bem e ajudar os necessitados em qualquer circunstância, sem maiores interesses. Quando essa ajuda é uma ação individual e isolada, é possível executá-la; mas, quando se trata de, num país com seus 212 milhões de habitantes, resolver o problema de 54 milhões de pobres, 13 milhões de miseráveis e perto de 20 milhões de desempregados, não sendo esse país rico em produto por habitante (embora seja rico de recursos naturais), as soluções são difíceis, demoradas, exigem eficiência e vão muito além da bondade individual.
Os graves problemas ligados à pobreza e ao desemprego não se resumem à virtude da bondade como fórmula de solução. Eles dependem de um conjunto de estruturas, instituições, corpo de leis, costumes, nível educacional, ética pública e eficiência governamental em todos os aspectos, além de capacidade para obter um sistema produtivo pujante e em crescimento sustentável ano a ano. O Brasil tem um longo caminho pela frente na tarefa de consertar seus erros históricos, que são muitos e envolvem um enorme conjunto de áreas, setores, instituições, leis, normas públicas e eficiência gerencial. Os eleitos dariam enorme contribuição para o combate à pobreza e ao desemprego se ajudassem o país a consertar suas estruturas, instituições, leis e práticas públicas, muito mais que ficar prometendo um pouco de dinheiro aqui e acolá. A política é um dos setores da ação humana coletiva que mais estão devendo em termos de melhoria e evolução.
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