À medida que o fim do ano se aproxima, chega também um prazo que nunca foi tão ressaltado: a metade do mandato presidencial. O artigo 81 da Constituição Federal prevê que, se os cargos de presidente e vice-presidente da República e vice ficarem vagos durante os dois primeiros anos do mandato, uma eleição direta escolherá um novo chefe do Executivo para completar o período; se a vacância ocorrer na segunda metade do mandato, cabe ao Congresso escolher um sucessor.
Dilma Rousseff foi cassada em agosto de 2015; e quanto a Michel Temer? O nome do presidente já apareceu em delações da Lava Jato, e não está afastada a possibilidade de a chapa Dilma-Temer ser cassada no TSE caso se comprove o uso de dinheiro desviado do petrolão na campanha – e não nos parece razoável a tese de separação entre contas da cabeça de chapa e seu vice, pois trata-se de uma única campanha. Com isso, começam a proliferar os promotores da instabilidade. Eles estão nas ruas, quebrando tudo, mas também estão no Congresso, propondo soluções que, mesmo cheias de boa vontade, aumentariam a confusão.
Uma dessas soluções é a PEC 227, de autoria de Miro Teixeira (Rede-RJ) e apresentada em junho. Ela prevê eleições diretas caso os cargos de presidente e vice-presidente fiquem vagos nos primeiros três anos e meio de mandato, com eleição indireta apenas se a vacância dupla ocorresse no semestre final. Não se pode negar que esta alteração na Constituição seria uma solução institucionalmente aceitável, proposta usando o caminho legítimo para tal; e também não há dúvidas de que uma eleição direta é sempre melhor que uma eleição indireta, especialmente quando se trata do cargo máximo do país.
Quem propõe uma nova Assembleia Constituinte não tem ideia do tamanho da ruptura que isso representa
Mas mudar as regras do jogo com a bola rolando nunca é a solução mais saudável. Imediatamente seria lançada a controvérsia sobre a aplicação da PEC ao mandato atual. O artigo 16 da Constituição diz que alterações no processo eleitoral só se aplicam a pleitos ocorridos a partir de um ano após a entrada em vigor da nova lei. A PEC valeria para quem foi eleito antes da vigência da emenda? Se Temer caísse, o Supremo teria de decidir se o sucessor seria escolhido pela regra antiga ou pela nova? Esse é o tipo de dúvida que causaria instabilidade onde ela precisa ser evitada a todo custo.
O mesmo Miro Teixeira e seu colega Rogério Rosso (PSD-DF) acabaram de apresentar uma PEC ainda mais drástica, a 298, que, se aprovada, uniria Câmara e Senado – sim, esta Câmara e este Senado, cheios de atuais e prováveis réus, que já deram mostras de não estar em sintonia com a população – em Assembleia Nacional Constituinte a partir de 1.º de fevereiro de 2017. Aqui, os riscos de instabilidade são maiores e mais amplos.
Quem propõe uma nova Assembleia Constituinte, por melhores que sejam suas intenções – os autores da PEC alegam a necessidade do “estabelecimento da normalidade e da pacificação institucional” –, não tem ideia do tamanho da ruptura que isso representa. É uma medida que se justifica em grandes transições, como a passagem da ditadura para a normalidade democrática nos anos 80, mas não no momento presente. O pacto desejado pela população já está dado, e concretizado na Constituição de 1988. Isso não mudou. Claro, sempre há possibilidade de aperfeiçoamento, que no entanto é melhor feito com o uso de emendas à atual Carta Magna.
Essa nova Constituinte “deliberará, preferencialmente, sobre matéria atinente à reforma política e eleitoral”, mas o texto não exclui nenhum tema a não ser os elencados no artigo 60 da atual Constituição. Isso significa que a própria moldura dentro da qual funcionam a sociedade e o governo já não existiria mais. Se isso já é prejudicial em circunstâncias normais, seria catastrófico em meio a uma crise econômica, política e moral como a atual. Em outras palavras, é como se todos os dispositivos que garantem a segurança dos passageiros de um veículo fossem retirados bem na hora de passar por uma estrada esburacada. Uma das consequências seria um governo acorrentado, pendente das deliberações dos constituintes. Nenhuma reforma importante, por exemplo, poderia ser implementada, sob risco de ser recusada pelos autores da nova Carta. Não se pode esperar “normalidade” e “pacificação” nesses termos.
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