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A propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão termina hoje, com uma mudança de última hora determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral que pode acabar se transformando em uma limitação à liberdade de expressão e ao direito dos eleitores a ter informação sobre os candidatos e partidos que disputarão as próximas eleições: daqui em diante, ataques e críticas não terão mais lugar na propaganda eleitoral.

A decisão veio após o TSE julgar uma ação proposta pela coligação de Aécio Neves (PSDB) contra uma inserção da campanha de Dilma Rousseff (PT). O tribunal não apenas deu razão a Aécio, mas foi além de meramente vetar o spot petista, passando a entender que a propaganda eleitoral deve necessariamente ter um cunho "positivo". "Essa decisão altera jurisprudência da Corte e caminha no bom sentido de estabelecer que, nos programas eleitorais gratuitos, as campanhas têm de ser programáticas e propositivas. Tem de se reformatar isso e acabar com essa pirotecnia", disse o presidente do TSE, Dias Toffoli, durante a sessão. Com base nesse entendimento, diversas outras inserções, de ambos os candidatos, já foram vetadas pelo tribunal desde então.

Como se pode ver, o próprio presidente do TSE afirma que a decisão altera a jurisprudência sobre o tema, tratando-se de uma inovação jurídica. De fato, a Lei Eleitoral (de 1965) e a Lei das Eleições (de 1997), em seus trechos sobre a propaganda eleitoral no rádio e na televisão, listam diversas práticas consideradas ilícitas na veiculação dos programas e spots. São proibidas, por exemplo, a incitação ao ódio, a injúria, a calúnia, a difamação, ou as trucagens que pretendam ridicularizar candidatos. As reclamações são rapidamente analisadas pelo TSE, e a legislação prevê a suspensão das peças ou a concessão de direito de resposta. Mas em nenhum momento a lei considera ilícita a crítica pura e simples. E é preciso questionar se há fundamento para vetá-la, como pretendem agora os membros do TSE.

Especialmente quando se trata de candidatos ou partidos que ocupam ou já ocuparam o governo, uma parte essencial do debate eleitoral gira em torno da avaliação da atuação passada ou presente dos postulantes ao cargo em disputa. Aqui, entram em jogo não apenas a comparação entre o que foi prometido e o que foi cumprido, mas também a exposição de eventuais escândalos que envolvam o uso irresponsável ou mesmo criminoso dos recursos públicos. A pergunta que se lança é: um governo inequivocamente incompetente e corrupto não poderia ter seus erros expostos por candidatos, partidos ou coligações de oposição no horário eleitoral? O eleitor tem o direito a essas informações, e o horário eleitoral, para muitos brasileiros, é a única oportunidade que eles têm de saber o que determinado governante ou partido fez ou deixou de fazer no poder. Trata-se de uma crítica legítima, amparada pelo direito constitucional à liberdade de expressão.

Uma coisa é a mentira, a campanha difamatória contra um candidato; outra coisa é expor maus indicadores de um governo, ou mencionar casos de corrupção. Mas, com sua nova jurisprudência, o TSE parece entender ambas as atitudes como igualmente reprováveis, puníveis com a suspensão da veiculação de propaganda eleitoral. Mais ainda: o tribunal não se limita a acrescentar novos "nãos" ao rol de ilícitos previstos pela legislação eleitoral, mas pretende direcionar os conteúdos, que agora devem ser "programáticos e propositivos" para que sejam passíveis de veiculação. Parece-nos uma extrapolação das intenções do legislador que desenhou os limites dentro dos quais os candidatos podem se mover na propaganda eleitoral.

Claro que é bom ter campanhas que priorizem ideias e projetos para o país, e não podemos aceitar a desconstrução mentirosa, que a legislação atual já condena e pune. Por isso, é louvável a intenção do TSE de elevar a qualidade do horário político, mas os meios escolhidos para tal são inadequados por engessar o conteúdo do programa eleitoral. Afinal, a crítica legítima também faz parte do jogo democrático, e assim deve continuar a ser.

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