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Editorial

Protecionismo nos céus

Acordo que elimina limites de tarifas e voos entre Brasil e União Europeia deixou de ser assinado na quinta-feira; pressão de empresas brasileiras influenciou a continuação do impasse

Uma tentativa de ampliar a concorrência no mercado aéreo brasileiro foi frustrada na quinta-feira, quando o governo federal não assinou um acordo de "céus abertos" com a União Europeia. O documento eliminaria as restrições ao número de voos entre Brasil e Europa, permitindo também que as empresas aéreas pudessem operar voos diretos a partir de qualquer aeroporto, aqui e no continente europeu. Além disso, os preços das tarifas também seriam liberados, sem os valores mínimos em vigor atualmente. Vários entraves na negociação impediram que o presidente do Conselho Europeu, Herman van Rompuy, e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, voltassem para Bruxelas com a assinatura – o protecionismo, novamente, foi invocado para manter a situação atual.

O Brasil já tem acordos semelhantes com algumas nações europeias isoladamente e vários outros países nas Américas, na Ásia e na África; o mais importante deles foi assinado com os Estados Unidos, em março de 2011. O texto prevê a liberação total de frequências de voo e tarifas até 2015, o que trará um ganho indubitável aos passageiros brasileiros, que também devem se beneficiar de políticas menos restritivas na concessão de vistos norte-americanos.

A primeira versão do texto deveria ter sido assinada em 2011, mas o Brasil discordou do item segundo o qual empresas aéreas brasileiras poderiam ter até 49% de participação estrangeira, ao contrário dos 20% permitidos hoje pela legislação. A União Europeia aceitou uma nova redação desse trecho, mas o acordo ainda tem arestas a aparar, como a questão da cobrança por emissões de carbono em voos que tenham a Europa como origem ou destino, iniciativa europeia que já causou controvérsias com empresas aéreas de quase todo o mundo.

No entanto, o principal obstáculo à assinatura do acordo está nas companhias aéreas brasileiras, que temem perder passageiros para as empresas europeias, mais competitivas. É verdade que os europeus também vêm recusando a possibilidade de uma companhia brasileira iniciar um voo no Brasil, fazer uma escala em algum país da UE e terminar o itinerário em outra nação do bloco, e vice-versa – o que, na prática, criaria uma ligação aérea entre duas cidades europeias operada por uma companhia brasileira. Mas, se toda a área da UE (ou pelo menos o chamado Espaço Schengen, dentro do qual cidadãos e turistas podem se deslocar livremente) for vista como um território único para efeitos de navegação aérea, este seria um mero caso de reciprocidade. Afinal, o Brasil também impede que empresas estrangeiras – mesmo aquelas de países com os quais já existem acordos de céus abertos – façam a cabotagem, como é chamado o transporte de passageiros ou carga dentro de um país.

Aqui, trata-se de uma situação em que o governo coloca o interesse das empresas aéreas acima das vantagens que um acordo traria para os cidadãos brasileiros. Se existe um déficit de competitividade entre as companhias brasileiras e europeias, o protecionismo é a pior maneira de incentivar Gol e TAM, as empresas que hoje operam voos para o exterior. Para o duopólio aéreo nacional competir de forma consistente com os preços praticados pelas companhias europeias, é preciso agir em duas frentes: melhorias na gestão das empresas (o que o protecionismo não estimula, ao bloquear a competição) e redução significativa da carga tributária (ação à qual o governo federal tem aversão). Também é necessário vigiar e denunciar caso as empresas europeias recebam subsídios governamentais que aumentem sua competitividade.

E nunca é demais recordar que acordos de céus abertos são importantes, mas não terão como ser implantados na prática se os aeroportos brasileiros não estiverem preparados para receber mais voos do exterior. Alguns dos documentos assinados com outros países chegam a excluir Guarulhos, o principal aeroporto internacional do Brasil, justamente por causa da falta de horários e infraestrutura para acomodar novos pousos e decolagens. O esforço interno para adequar os terminais e o fim do protecionismo só trarão benefícios ao passageiro brasileiro.

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