O Brasil acaba de entrar em zona de conflito econômico com a União Europeia (UE) e o Japão. Em um documento com mais de 3 mil páginas apresentado à Organização Mundial do Comércio (OMC), a UE contesta a proteção à indústria nacional feita pelo governo Dilma Rousseff e destaca que o Brasil ergueu barreiras comerciais pesadas por meio de tributação indireta sobre produtos importados, em alguns casos passando dos 80%. O Japão também apresentou ação contra a política industrial brasileira, sob a alegação de que o governo brasileiro viola normas da OMC e causa prejuízo à competição e ao consumidor nacional.

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Na ação promovida pela UE contra o Brasil, são anexados mais de 200 documentos em mais de 2,5 mil páginas com o que seriam as provas da violação de regras, tais como leis, portarias e outras medidas implementadas para proteger as empresas nacionais. A UE pede que o Brasil seja condenado por discriminação a produtos estrangeiros, uso de subsídios vinculados à exportação e ao conteúdo local, e programas que beneficiam os setores automotivo, eletrônico e de máquinas de uso profissional ou industrial. Em relação a esse processo, duas questões essenciais se destacam: o direito do país em promover incentivo à indústria nacional, de um lado; e o fato de os países promotores da ação contra o Brasil também fazerem uso de subsídios internos, sobretudo os destinados a proteger a ineficiente agricultura europeia e japonesa.

O Brasil insistiu em aprovar continuamente medidas de proteção ao produto nacional

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Nos tratados internacionais e na ação dos organismos reguladores do comércio exterior, sobretudo a OMC, reconhece-se o direito de as nações desenvolverem programas de incentivo à ciência e à pesquisa, e os destinados à absorção de tecnologias desenvolvidas no resto do mundo. Também é aceito que os países adotem política cambial capaz de estabelecer o preço da moeda estrangeira em patamar realista. A taxa de câmbio pode – e deve – flutuar livremente de forma a sofrer desvalorização (aumento do preço do dólar) quando o país vai mal e ser valorizada (redução do preço do dólar) quando o país vai bem.

Um exemplo dos problemas vividos pelo Brasil vem do tempo em que, mesmo com inflação se repetindo ano após ano, o preço do dólar se manteve em níveis muito baixos, criando prejuízo para empresas exportadoras nacionais e favorecendo as empresas estrangeiras fornecedoras do Brasil. Nos últimos anos do governo Lula, o preço do dólar permaneceu por bom tempo abaixo dos R$ 2, contra uma inflação acumulada desde julho de 1994 (quando foi implantado o Plano Real e a taxa de câmbio foi fixada em R$ 1 por dólar) acima de 350% nos 20 anos seguintes. Por essa razão, os exportadores diziam que a taxa de câmbio necessária, após descontar a inflação internacional e os ganhos de produtividade da economia brasileira, deveria situar-se em torno dos R$ 3,20.

Com a taxa de câmbio muito baixa, mesmo as políticas de proteção acabam por não funcionar, tendo seu efeito anulado pela redução na receita dos exportadores e pelo estímulo sobre as importações, que se tornam atrativas e mais baratas que os produtos nacionais. O Brasil insistiu em aprovar continuamente medidas de proteção ao produto nacional e, após a taxa de câmbio ter sido desvalorizada e o preço do dólar ter sido jogado para acima dos R$ 3, o Japão e a UE resolveram entrar com ação na OMC para contestar a política protecionista brasileira.

Tanto Japão quanto vários países europeus oferecem subsídios a produtores agrícolas nacionais, e o Brasil já promoveu ações contra as práticas dessas nações. Embora esses países não sejam completamente isentos de culpa em suas práticas protecionistas, a reclamação contra as medidas do governo Dilma diz respeito à dosagem do protecionismo brasileiro, que, segundo os reclamantes, está fora dos limites aceitos de incentivo à pesquisa e à tecnologia, vai contra normas da OMC, discrimina os produtos estrangeiros e prejudica o consumidor brasileiro ao obrigá-lo a pagar mais caro pelo produto nacional.

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Assim, a questão estaria no abuso praticado pelo governo brasileiro e na violação de normas de comércio internacional. Se as afirmações dos reclamantes se mostrarem verdadeiras, a conjunção de medidas protecionistas e dólar alto se revelaria contra o interesse do próprio trabalhador brasileiro – que, ao pagar mais por produtos nacionais, estaria sustentando uma indústria nacional ineficiente, parte por culpa da própria indústria e parte por culpa da precária infraestrutura física do país. Os desdobramentos do julgamento permitirão melhor avaliação dos argumentos levantados pelos países contendores e das práticas protecionistas brasileiras.