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Apoiadores escutam o líder Juan Guaidó em Caracas.
Apoiadores escutam o líder Juan Guaidó em Caracas.| Foto: Andrea Hernandez Briceno / Washington Post

Com a aproximação do final de ano, pessoas, empresas e governos fazem seus balanços e avaliam o que foi bom e aquilo em que poderiam melhorar. No caso de nosso país vizinho, a Venezuela, esse ano poderia ser descrito pelo célebre verso de Manuel Bandeira: “a vida inteira que podia ter sido e que não foi”.

Em janeiro, após mais uma vitória de Maduro nas eleições presidenciais, desta vez consideradas fraudulentas por todos os países democráticos, Juan Guaidó, como presidente da Assembleia Nacional, tomou a coragem de fazer o que todos os líderes de oposição anteriores temeram: reivindicou publicamente a presidência do país.

A partir daí, vários países, incluindo EUA, Brasil e Colômbia, começaram a apoiar o novo presidente interino, reconhecendo o seu mandato e procurando a convocação de novas eleições para que o povo venezuelano pudesse escolher quem seria seu novo presidente.

Mas Nicolás Maduro, assumindo de vez sua postura ditatorial, negou-se a reconhecer a legalidade das ações de Guaidó. E apegou-se a sua cadeira, contando com o apoio das forças armadas e das potências internacionais China e Rússia (que enxergam na Venezuela um excelente aliado estratégico na geopolítica mundial).

Maduro afirmou que tudo se tratava de um complô internacional contra ele capitaneado pelos Estados Unidos. Enquanto isso, apagões, falta de medicamentos e comida forçavam a população venezuelana (que nesse momento apoiava Guaidó em peso nas ruas) a emigrarem para os países vizinhos, criando uma crise demográfica sem precedentes na América Latina, com centenas de milhares de pessoas tendo de ser realocadas em países cujas economias não estavam em seu melhor momento (para se ter uma ideia quantitativa, até o final de 2019, cerca de 4,5 milhões de venezuelanos, 15% da população, terão saído do país).

Em meio a essa situação, Guaidó tentou em fevereiro deste ano furar o bloqueio militar imposto por Maduro nas fronteiras da Venezuela com Brasil e Colômbia, para que ajuda humanitária pudesse chegar ao país. Ele esperava que essa atitude fizesse com que os soldados venezuelanos desertassem, mas isso não aconteceu.

Enquanto isso, o povo continuava organizando manifestações em apoio ao presidente interino e os EUA forçavam a abdicação de Maduro com sanções econômicas. Contudo, a situação não se resolvia.

Em 30 de abril, Guaidó tentou outra estratégia. Apareceu na base aérea de La Carlota, em Caracas, com alguns soltados, e apelou aos militares que se rebelassem contra Maduro. Venezuelanos saíram às ruas em um protesto que parecia ser o ponto de inflexão na luta para o retorno da normalidade democrática ao país. Mas logo soube-se que parte dos militares dos quais Guaidó esperava apoio não aderiram ao levante. E o plano naufragou.

Desde então, Maduro ganhou confiança de que permaneceria no poder, e começou a usar todos os meios que tem a disposição, sobretudo com denúncias de “corrupção” envolvendo o partido de Guaidó, para desacreditar o presidente interino perante a opinião pública dentro e fora da Venezuela. E é assim, prendendo pontualmente algum membro da oposição e “cozinhando em fogo baixo” o prestígio de seu principal opositor, que o ditador bolivariano tem procurado levar seu plano a cabo: impedir Guaidó de vencer a reeleição como presidente da Assembleia Nacional no próximo mês.

Isso o privaria da base legal de sua reivindicação à presidência – e certamente é o pretexto que Maduro precisa para colocar Guaidó na prisão. Situação que o ditador bolivariano tem evitado, tanto por não encontrar previsão legal, como pelo medo da reação internacional.

Guaidó, por sua vez, depois de fracassar na tentativa de negociação intermediada pela Noruega com Maduro, para que ambos renunciassem, coloca suas esperanças numa melhora de relacionamento com as forças armadas – sem explicar ainda como conseguiria isso.

Com o passar do tempo, as ameaças veladas dos EUA sobre uma possível invasão militar na Venezuela soam como um blefe. E a população vai perdendo a confiança em seu presidente interino.

Uma leve melhora nas condições de vida dos venezuelanos (que ainda são muito precárias) vai arrefecendo o movimento de ruas. E aquilo que teria sido uma bela história de liberdade tem se tornado um arrastado final da oposição a um ditador tenaz.

Resta saber se a virada de ano pode injetar novo ânimo ao movimento de libertação da Venezuela. Para tanto, o mínimo a se fazer é que a comunidade internacional não se esqueça de acompanhar o que acontece no país, e não deixe a situação do povo venezuelano de fora do noticiário. Quem sabe não surja, tão surpreendentemente quanto o aparecimento de Guaidó em janeiro deste ano, alguém capaz de congregar forças para devolver o país à normalidade democrática?

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