Além das multitudinárias manifestações contra o governo Dilma, e das bem mais diminutas passeatas defendendo o PT, outro movimento popular ganha força: em cidades do interior do Paraná, como Jacarezinho e Santo Antônio da Platina, a pressão da população levou os vereadores a cortar o próprio salário – no caso de Santo Antônio da Platina, os eleitos em 2016 receberão R$ 970 mensais, após revolta popular com proposta que praticamente dobraria os vencimentos, de R$ 3,7 mil para R$ 7,5 mil. Em Curitiba, está marcada uma manifestação na Câmara Municipal nesta terça-feira, dia 25. O objetivo é conseguir que os vereadores recebam R$ 1,5 mil a partir de 2017 (uma redução de 90% em relação ao salário atual, de R$ 15 mil). Eis uma ótima oportunidade para refletir sobre o funcionamento dos Legislativos municipais.
Se deixássemos de lado os penduricalhos e nos ativéssemos somente ao que é importante, que grau de dedicação seria exigido dos vereadores?
O pacto federativo torto que vigora no Brasil concentra poderes demais em Brasília, quando deveria ocorrer o contrário; afinal, como já afirmou a presidente Dilma Rousseff em um momento de clareza de seus discursos nem sempre compreensíveis, as pessoas não vivem na União, vivem nos municípios. Com milhares de determinações vindo do Congresso, e várias outras das assembleias legislativas, as câmaras de vereadores têm pouca margem de manobra; assim se consagrou a noção de que os vereadores passam a maior parte do tempo deliberando sobre nomes de ruas, datas comemorativas e homenagens a cidadãos honorários – isso quando, para escapar dessa trinca, não estão servindo como despachantes de interesses paroquiais e criando regulamentações que engessam a vida do cidadão e do empreendedor, naqueles poucos temas que ainda são de competência municipal.
Obviamente, resumir o trabalho dos vereadores a apenas nomear ruas, criar festas, homenagear pessoas e super-regular o dia a dia da cidade é uma generalização injusta. Há temas muito relevantes na pauta de uma Câmara – em Curitiba, por exemplo, está em tramitação o Plano Diretor, que ajudará a definir os rumos do crescimento da cidade nos próximos anos. A pergunta que se coloca é: se deixássemos de lado os penduricalhos e nos ativéssemos somente ao que é importante, que grau de dedicação seria exigido dos vereadores? E qual seria a remuneração correspondente? Em cidades menores, o trabalho do Legislativo não exige dedicação integral e as sessões ocorrem fora do horário comercial, permitindo ao detentor de mandato seguir com sua atividade de origem. O salário de vereador, assim, seria mais uma “ajuda de custo”, e não a fonte primária de sustento. Mas seria possível replicar esta dinâmica em cidades maiores?
Além disso, os salários dos vereadores estão longe de ser o único fator de polêmica. Estruturas inchadas de gabinetes e salários de funcionários comissionados também criam gastos questionáveis. Em 2012, o Ministério Público recomendou à Câmara de Curitiba que demitisse 40% dos seus comissionados para que o número desses servidores não ultrapassasse o de concursados – a recomendação só foi seguida em 2013, com o corte de 259 comissionados. Hoje, um terço dos comissionados da Câmara (38 chefes de gabinete e 63 assessores) recebem pelo menos R$ 9 mil. Cada vereador tem direito a cerca de R$ 50 mil mensais em salários para compor sua equipe. São gastos que merecem um pente-fino mais cuidadoso, para que se avalie sua real necessidade.
A discussão sobre os salários dos vereadores é pertinente, mas é preciso tomar cuidado para que não caia na demagogia. Ter em conta a realidade do município é importante para que os vencimentos não sejam muito descolados da média local; ao mesmo tempo, nos casos em que a vereança exija dedicação integral, é necessário que o salário não seja tão baixo a ponto de desestimular pessoas boas que poderiam ser atraídas para a política, e nem tão alto a ponto de atrair aqueles interessados apenas nas benesses do cargo. Independentemente do desfecho da polêmica em cada cidade, uma lição já aprendida é a de que o cidadão precisa prestar mais atenção ao Poder Legislativo municipal: não só quanto ganham, mas o que estão fazendo aqueles que foram eleitos para representar a população na instância que está mais próxima dela.
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