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Editorial

Que legado a Copa nos deixa?

Com a Copa do Mundo encerrada, é hora de analisar quais eram as expectativas antes do Mundial e compará-las com os resultados. Os gastos com a competição levaram às ruas muitos dos manifestantes de junho de 2013. Agora, com os benefícios do outro lado da balança, podemos avaliar com ponderação o que a Copa nos trouxe. Nessa hora, a palavra mais citada é "legado". E não há dúvida de que houve, sim, legados, tanto positivos quanto negativos. Quais deles, no entanto, permanecerão – para o bem e para o mal – é algo que só o passar do tempo nos dirá.

Um legado indiscutivelmente positivo é a promoção da imagem do Brasil no exterior. Segundo o Ministério do Turismo, o país recebeu 1 milhão de estrangeiros, de 202 nacionalidades, e 61% fizeram sua primeira visita ao Brasil por ocasião da Copa – muitas dessas pessoas talvez jamais considerassem a possibilidade de vir ao Brasil, se não fosse pelo fato de estarmos organizando o Mundial. Curitiba também ganhou nesse aspecto. De acordo com estudo feito pela UFPR, a cidade recebeu em junho 214,5 mil turistas, dos quais 95,8 mil estrangeiros, de 73 países. O setor hoteleiro, que esperava aumento de 30% na ocupação com a Copa, teve suas expectativas superadas, e os bares também viram a clientela subir de 50% a 70%.

E a imagem do Brasil não melhorou apenas aos olhos dos estrangeiros – nós mesmos redescobrimos nossa cordialidade. Não há dúvidas de que ela tem boa participação em outra estatística animadora: 95% dos estrangeiros entrevistados pela Fipe disseram ter vontade de voltar ao Brasil – em Curitiba, a UFPR apurou que 93% dos visitantes recomendarão a cidade como destino turístico para outras pessoas. Essa é a chave para que esse legado seja duradouro e não apenas temporário. Pelo potencial turístico que temos, os 6 milhões de estrangeiros que vieram ao Brasil em 2013 ainda são muito pouco em comparação com outros países – a França, líder nesse quesito, supera os 80 milhões. O décimo país nesse ranking, a Tailândia, atraiu 26,5 milhões de visitantes estrangeiros no ano passado. A Copa apresentou o Brasil a muitas pessoas, mas só uma divulgação eficaz do Brasil no exterior fará delas turistas habituais.

Na ponta negativa ficou o legado urbanístico e de infraestrutura. É verdade que o apagão logístico tão temido e previsto não se concretizou. Mesmo assim, daquilo que nos havia sido prometido como resultado da Copa em termos de obras, não temos tanto para ver. O jornal Folha de S.Paulo analisou 167 obras prometidas para o Mundial, das quais apenas 88 (ou seja, pouco mais da metade) foram entregues a tempo. Outras 45 foram entregues, mas não estavam completas; 23 serão executadas apenas agora que a Copa já terminou, e 11 foram simplesmente descartadas. A Gazeta do Povo tinha publicado, em 2009, a lista de obras com as quais Curitiba buscou (e conseguiu) convencer a organização da Copa a trazer jogos para a cidade. Eram 16 itens, a maioria dos quais não saiu do papel, como a reforma da Avenida Cândido de Abreu. O carro-chefe da campanha curitibana era o metrô, mas ele só ficará pronto muito depois da Copa.

Sabemos que todas essas obras, salvo uma ou outra exceção, eram e são necessárias ainda que não houvesse Copa do Mundo no Brasil, e o fato de termos chegado a esse ponto mostra a ineficiência da máquina pública no que diz respeito à execução. A realização do evento era uma chance única de desatar esses nós, pois as melhorias passariam a ter de ficar prontas "para a Copa" – chance essa que acabou desperdiçada em boa parte dos casos.

Isso nos leva a um terceiro legado: a Copa nos mostrou, de forma escancarada e em uma dimensão que talvez nunca tenhamos visto antes, nossos problemas de planejamento. Os estádios são o exemplo acabado dessa situação. Em 2007, Lula e seu então ministro do Esporte, Orlando Silva, juravam que não haveria um centavo de dinheiro público nas arenas. Não foi o que aconteceu: não apenas faltou um plano para realmente envolver a iniciativa privada, como no fim todos os estádios contaram com porções mais ou menos generosas de dinheiro do governo federal – por meio de empréstimos a juros camaradas –, dos governos estaduais e de prefeituras. O poder público muitas vezes foi feito refém, tendo de despejar mais e mais dinheiro nos estádios (no total, foram R$ 8 bilhões) para evitar um vexame na Copa. Outras obras foram feitas às pressas, o que resultou, por exemplo, na tragédia do viaduto que desabou em Belo Horizonte, matando duas pessoas.

No fim, são os brasileiros que decidirão o que fazer de cada um desses legados. Se não aproveitarmos as oportunidades trazidas pela Copa, se não aprendermos com as falhas e não mandarmos nosso recado aos responsáveis por elas, não há gol de placa ou festa nas ruas que faça a Copa de 2014 ter valido a pena.

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