Graças a uma ação ajuizada ontem pelo Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra a chamada PEC do calote, mais uma grande decisão que envolve milhares de brasileiros está nas mãos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A Ordem pede que a corte declare inconstitucional a emenda que permite que até 50% dos recursos reservados a pagamento de precatórios sejam destinados a leilões por menor preço ou a câmaras de conciliação, onde se faz acordo entre as duas partes. E, para minimizar os danos que essa mudança na Constituição Federal pode causar ao possibilitar que estados, municípios e Distrito Federal não paguem suas dívidas, a OAB requer uma liminar contra as mesas diretoras da Câmara e do Senado para que suspenda seus efeitos ainda antes do julgamento final.
Mas o presidente do STF, Gilmar Mendes, já sinalizou concordância com a PEC. Ainda ontem ele afirmou que os estados e municípios não conseguiriam suportar o pagamento imediato dos precatórios e que "a proposta de parcelamento das dívidas públicas não é maldade cometida pelos agentes públicos". Infelizmente, ao dar essa declaração, Gilmar Mendes pareceu não ter levado em conta um fundamento da justiça, o de que os titulares de precatórios possuem um direito líquido, certo e irrecorrível.
A legislação recentemente aprovada no Congresso prevê que estados, Distrito Federal e municípios poderão parcelar suas dívidas em até 15 anos, ou, ainda, optar por depositar apenas um determinado porcentual de sua "receita corrente líquida", sem prazo máximo determinado para o pagamento total das suas dívidas. Valerá o que lhes for mais conveniente, ou seja, é óbvio que a segunda alternativa.
Se nem mesmo a legislação anterior mais favorável aos titulares de precatórios e que previa o pagamento por ordem cronológica até o último dia do exercício seguinte era cumprida, como podemos esperar que no cenário projetado pela PEC se faça justiça aos cidadãos? Ora, foi justamente o não cumprimento da legislação anterior que fez com que a dívida chegasse a R$ 100 bilhões, montante esse que, muito provavelmente, se multiplicará, transformando-se no maior calote oficial já visto na história deste país.
Na ação, a OAB frisa ainda que, ao fazer tal mudança na Constituição, o Congresso "desobedeceu aos limites materiais do Estado Democrático de Direito e atentou contra a dignidade da pessoa humana, à separação dos poderes, aos princípios da segurança jurídica, da proteção ao direito de propriedade e do ato jurídico perfeito".
É excelente que instituições de grande representatividade nacional, como a Ordem dos Advogados do Brasil, exijam mais responsabilidade dos poderes públicos diante de um cenário tão desfavorável para os cidadãos brasileiros. Uma luta como essa merece ser apoiada por outros representantes da sociedade civil, e espera-se que a ação ajuizada pela OAB seja a primeira de várias que se seguirão para cobrar do Supremo o seu papel de sopesamento de questões constitucionais com base nos freios e contrapesos da democracia brasileira.
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