A prodigalidade com que o presidente Michel Temer tratou o funcionalismo público no início de seu mandato, há um ano, está cobrando seu preço. A União tem agora de lidar com dois anos seguidos de crescimento do gasto com a folha de pagamentos acima da inflação e, portanto, acima da correção máxima estipulada pelo teto de gastos do orçamento.
Os números levantados pelos consultores do Congresso são bastante preocupantes. O gasto com pessoal na esfera federal deve crescer 9,5% neste ano – contra um ajuste de 7,2% no orçamento e uma inflação hoje abaixo de 4%. No ano que vem, deve crescer outros 8%, diante de um ajuste de menos de 4% no bolo do orçamento. O governo precisa arrumar dinheiro para pagar essa conta e só pode contar com uma previsão orçamentária limitada pelo teto.
Essa situação era previsível – há um ano, especialistas já alertavam que o governo deveria antes perseguir o equilíbrio fiscal para em seguida negociar reajustes que coubessem no novo orçamento. O conselho foi ignorado por Temer, que preferiu agradar o funcionalismo.
O governo se vê agora diante de um dilema. Para pagar a conta do reajuste, precisará cortar em outras áreas. Está difícil encontrar dinheiro fora do que se chama de gastos obrigatórios – aqueles que são previstos em lei e que a princípio não podem ser ignorados pelo gestor público. Isso porque a arrecadação ainda não está reagindo com a melhora da economia e, ao mesmo tempo, há quase nenhuma margem para cortes de gastos não obrigatórios, como evidencia a paralisia de alguns órgãos públicos.
Se não houver uma nova ideia para se buscarem receitas não recorrentes, ou se a arrecadação não reagir, o governo terá de escolher entre manter os reajustes ou cortar algum gasto que fará falta em outra parte. Qual a saída mais justa?
Uma possibilidade a ser estudada é o congelamento desses acordos enquanto não houver disponibilidade orçamentária. A outra saída é encontrar algum gasto que possa ser cortado com o menor dano social possível – está na mesa, por exemplo, o fim do abono salarial.
Seria até saudável que o governo aprofundasse o debate sobre os gastos obrigatórios e colocasse para a sociedade quais são pouco eficientes. Mas o ideal é que não seja conduzido apenas pela necessidade de se fecharem as contas para o pagamento do funcionalismo. É hora de o governo dar em troca um plano concreto de reforma administrativa que desconstrua a ilha que se construiu para os funcionários da União.
Neste ano, a diferença entre os salários do funcionalismo (incluindo estados e municípios) e a iniciativa privada bateu recorde. Na média, o setor público paga 68% mais do que o setor privado. A gestão de pessoal, além de mais cara, tem pouco foco na eficiência. As avaliações de desempenho são pouco transparentes, ao mesmo tempo em que a estabilidade extrapola de longe o que seria necessário – somente funções sensíveis, como juízes e promotores, deveriam ter tal direito.
Além de uma reforma administrativa, a reforma da Previdência precisa aumentar a igualdade entre o setor público e o privado. O déficit das aposentadorias do setor público foi de R$ 77 bilhões no ano passado, contra R$ 151 bilhões do INSS. A diferença é que o primeiro atende 1 milhão de aposentados e pensionistas, contra quase 30 milhões no segundo. Na reforma em tramitação no Congresso, as regras de aposentadoria vão convergir para um modelo único que não abarcará os militares. As concessões para professores, policiais e funcionários com direito a aposentadoria integral enfraqueceu ainda mais um projeto que hoje corre o risco de nem avançar.
Não se pode ignorar nesse debate o argumento de que o funcionalismo público necessita de um sistema diferente da iniciativa privada. Mas sua validade é bastante limitada e deveria ser aplicado apenas a exceções. O acúmulo de “penduricalhos” que se somam aos salários, a estabilidade quase inquestionável, a falta de metas transparentes de produtividade e qualidade no atendimento, e a evidente desigualdade de remuneração precisam ser discutidos dentro da lista de coisas a serem reformadas no Estado brasileiro.
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