A posse do novo presidente da Bolívia e a eleição de Cavaco Silva como presidente de Portugal foram acontecimentos políticos da semana, com interesse para o Brasil, vizinho dos bolivianos na América do Sul e fundado pelos portugueses há mais de 505 anos. A evolução política de ambos determinando uma guinada à esquerda na nação andina e um retorno à direita na pátria lusitana é válida aos brasileiros neste ano de eleições gerais.
O novo dirigente boliviano, Evo Morales, foi eleito após um ciclo de instabilidade ante a incapacidade dos governos anteriores, alinhados por um viés liberal, de encaminhar satisfatoriamente os problemas de pobreza e exclusão que afligem a maior parte da população, descendente das tribos indígenas do período colonial. O drama da Bolívia é realçado pela divisão do país em duas metades, uma em desenvolvimento e outra estagnada: a região da planície boliviana, com pólo em Santa Cruz de La Sierra, experimentou forte expansão com a introdução de lavouras modernas como a soja; enquanto a área mais ao sul, polarizada por Tarija, centraliza a exploração do petróleo e gás.
Na metade serrana onde está a capital, La Paz, os habitantes indígenas empobrecidos após o esgotamento das minas de prata e estanho se voltam para o cultivo da folha de coca, que serve como tônico para suportar a altitude, mas também se presta ao processamento como cocaína. Por isso a cultura de coca tem sido combatida por governos de países acossados pelo consumo de drogas, como os Estados Unidos; o que gerou tensões com os plantadores tradicionais entre eles o novo líder boliviano, eleito com um programa de tons radicais que inclui valorização dos recursos energéticos e distanciamento dos norte-americanos.
Em seu discurso de posse, o presidente Morales prometeu nacionalizar o gás e petróleo o que afeta nossos interesses e acabar com a pobreza, promessa de cumprimento difícil no horizonte de um mandato presidencial, mas viável se apoiada em programas conjugados com o funcionamento regular da economia. Esse a propósito foi o desafio dos portugueses, que nas eleições de domingo deram vitória ao líder conservador Cavaco Silva, voltando as costas a figuras históricas como o ex-presidente Mário Soares.
Embora beneficiada com sua adesão à União Européia dos 15 (o bloco intermediário antes da expansão da Comunidade para o Leste), a sociedade portuguesa não conseguiu acompanhar o ritmo dos seus parceiros, ao contrário, por exemplo, de outra nação de raiz celta similar, a Irlanda. Crescendo a taxas firmes e continuadas, os irlandeses repetem o desempenho do Chile em nosso continente após a ditadura de Pinochet.
O Brasil pode extrair lições dessas experiências de resultados diversos, orientando-se por reformas modernizadoras e gestão pública, aplicando esforços para incluir seus grupos em desvantagem; porém sempre respeitando os limites do bom senso, porque, em vez de dar o peixe mais vale ensinar a pescar.