No princípio era a descrença. Apesar do caos político e econômico do país, apesar dos grandes protestos de rua, ainda não se via no horizonte a possibilidade concreta de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Salvo alguns convictos juristas e raros políticos de oposição, os brasileiros, de modo geral, sacavam a velha máxima segundo a qual tudo terminaria em pizza. O passar dos meses, a revelação paulatina – mas veloz – do que acontecia nos porões do governo, o concubinato deste com generosas empreiteiras, o esfacelamento moral e político da biografia do padrinho Luiz Inácio Lula da Silva; tudo isso, somado ao crescente sentimento popular que passou a dominar as ruas, já aponta destino diferente do que prenunciavam os incrédulos.

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Os fatos são inquestionáveis, e a irregularidade ficou ainda mais evidente graças ao Tribunal de Contas da União (TCU). Ali ficou configurado, no julgamento sobre as contas de 2014, que Dilma cometera crime de responsabilidade ao adotar as “pedaladas fiscais” para maquiar gastos públicos. E crime de responsabilidade, diz a Constituição, é motivo para se decretar o impedimento do governante. Assim entenderam também alguns dos mais respeitados juristas do país – dentre os quais Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT –, que ingressaram com requerimento à Câmara para que iniciasse o processo de remoção de Dilma da Presidência. Eis a primeira perna do tripé do impeachment: a existência concreta de um crime de responsabilidade.

Mais uma vez a Ordem se coloca do lado da moralidade e da lisura no trato da coisa pública

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Obedecidas as regras processuais definidas pelo Supremo Tribunal Federal, já funciona na Câmara dos Deputados uma comissão para julgar se há ou não motivação para o impeachment, abrindo-se prazo para que Dilma exerça seu mais amplo direito de defesa. Caem por terra as insistentes afirmações vindas do Planalto e ecoadas nas ruas por facções arregimentadas pelo PT de que impeachment é golpe. Golpe seria se as razões para o impedimento não estivessem presentes na Lei Maior; se os passos para o cumprimento da lei já não tivessem sido referendados pelo STF; se houvesse a mínima sombra de que, outra vez, o governo estivesse sob a mira de uma quartelada. Mas não é nada disso que ocorre.

Milhões de pessoas no país inteiro respaldam a movimentação pelo impeachment. As multidões na rua são outra evidência do querer popular, que não pode ser desprezado ou confundido como se fossem vozes do golpe. O apoio das ruas é a segunda perna do tripé do impeachment. E, para a estrutura se erguer solidamente em pé, a terceira perna é a participação da sociedade civil organizada. Felizmente, a compreensão das ruas é compartilhada por diversas instituições e grandes entidades empresariais, inclusive no Paraná, que já haviam se manifestado e nos últimos dias reforçaram sua posição pela saída de Dilma. E, na última sexta-feira, o impeachment ganhou um aliado de peso.

Partiu da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), com apoio de 26 das 27 seccionais estaduais, um manifesto em que apoia o pedido de impeachment. “É forçoso admitir que existem, sim, elementos jurídicos completos que conduzem a um pedido de impedimento pelos atos contábeis”, afirma a entidade.

O significado desse apoio é enorme. A OAB foi uma das entidades que mais lutou pelo impeachment de Fernando Collor, em 1992 – ela foi signatária do pedido, ao lado da Associação Brasileira de Imprensa. Agora, mais uma vez a Ordem se coloca do lado da moralidade e da lisura no trato da coisa pública. Prova disso é que a OAB, além de elencar os argumentos já usados no pedido de impeachment em andamento na Câmara, também citou em sua nota desdobramentos recentes, como a delação do senador Delcídio do Amaral e o coroamento da desfaçatez que tomou conta do Planalto: a tentativa de conceder esconderijo a Lula dando-lhe o gabinete da Casa Civil, o que pode ser considerado tentativa de obstruir o trabalho da Justiça.

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Que a adesão da OAB estimule ainda mais entidades representativas da sociedade civil a compreender a gravidade das práticas adotadas pelo governo Dilma e contribuir no esforço duro, lento, mas profundamente meritório, de construir um país melhor.