Tornou-se consenso nacional que o Brasil chegou à terceira década deste século 21 com uma das piores estruturas tributárias do mundo. O efeito inibidor do crescimento econômico causado pelo sistema tributário e sua contribuição para a elevação de custos, desperdícios e redução da produtividade econômica são reconhecidos, e disso praticamente ninguém discorda. Assim, tornou-se necessária e desejável alguma reforma capaz de melhorar o sistema, reduzir suas distorções, baixar os custos da obediência e da contabilidade tributária, e fazer que o país avance na correção das graves distorções existentes.
O Brasil está organizado politicamente pelo modelo de federação, com um Estado nacional estruturado por uma lei fundamental – a Constituição Federal, que abrange todo o território nacional –, dividido em estados regionais com seus territórios delimitados e administrados por um Poder Legislativo estadual e um governo local, cuja autonomia política e administrativa consta da Constituição Estadual; e os municípios resultantes de divisão espacial dentro dos estados, com autonomia política e administrativa municipal, porém, subordinados às esferas federativas maiores – os estados e a União – e regulados pela Lei Orgânica Municipal. Nos municípios, a lei orgânica é uma espécie de constituição, cujo teor e dispositivos não podem conflitar com a Constituição Federal e a Constituição Estadual.
A estrutura tributária do país é estabelecida pela Constituição Federal, que define o conjunto de tributos, as alíquotas, os objetos e as bases tributadas, além das competências que cabem aos estados e aos municípios. A Constituição Federal estabelece que regulações de estrutura somente podem ser baixadas pela própria Constituição e suas emendas, deixando a fixação de alíquotas para as leis complementares, bem como explicita as autonomias e poderes dos estados e dos municípios em matérias de tributação e suas normas operacionais.
Caso a reforma tributária não seja bem conduzida nesta fase de regulamentação, pode criar um caos grande o suficiente para boicotar qualquer pretensão de crescimento econômico
Em linhas gerais, esse é esquema que existe e, de tanto mudar, responde pela situação atual de verdadeiro caos no que se transformaram o sistema tributário, a carga de impostos e o distorcido edifício de leis e normas tributárias nas esferas nacional, estadual e municipal. O Brasil está diante do processo de reforma tributária em andamento no Congresso Nacional, cuja estrutura geral foi aprovada, estando agora na fase de tramitação das leis complementares que fixarão as alíquotas, os objetos tributados, as exceções, as regras de funcionamento e as prerrogativas e deveres que ficarão a cargo da União, dos estados e dos municípios.
Os entes e objetos tributados principais são pessoas, empresas e outras pessoas jurídicas de diversas naturezas e ramos de atividade, cujos tributos são pagos em função de propriedade, produção, renda, consumo, compras, vendas, doações, heranças e bens coletivos colocados à disposição da sociedade pelo poder público. O sistema tributário brasileiro atingiu um tal ponto de distorção, ineficiência e custo que se tornou consenso entre empresários, economistas, advogados tributaristas e especialistas sobre impactos econômicos que realmente é um sistema carente de reforma.
Um símbolo dos grandes defeitos do sistema tributário brasileiro, para citar apenas um, é o fato de haver cinco tributos sobre o consumo, todos eles com milhões de leis, portarias, instruções e outros regulamentos tão difíceis de conhecer quanto de cumprir. O consumo é carregado com cinco tributos: o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS). Esses cinco tributos são regulados e cobrados pela União, estados e municípios, cada qual com sua competência e atribuição, além das interferências de um ente federativo sobre as competências de outro ente.
Pois é essa gigantesca confusão que o Brasil construiu e da qual tem dificuldade em sair, inclusive porque há enorme divergência entre políticos e especialistas sobre o que vai ser a nova estrutura tributária, principalmente quanto à possibilidade de a reforma criar distorções capazes de piorar muito o sistema atual, que já é ruim. O anúncio de que o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) somado à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – esta última, federal; aquela, estadual/municipal – pode levar este IVA dual à alíquota de 28%, a maior do mundo, mais a hipótese de que esses tributos significarão aumentos explosivos sobre certos setores, produtos e atividades podem criar um caos no país, incluindo o risco de inflação e desordem no sistema produtivo.
O que se nota no horizonte político e legislativo do país é que a reforma tributária, em que pese a urgente simplificação por ela promovida na tributação sobre produção e consumo, caso não seja bem conduzida nesta fase de regulamentação, pode criar um caos grande o suficiente para boicotar qualquer pretensão de crescimento econômico e manter o Brasil definitivamente no clube das nações atrasadas, com baixa produtividade e pobreza. Reformar é uma necessidade, desde que para melhorar o que existe, e não para criar ainda mais confusão. Agora que a regulamentação da primeira fase da reforma tributária voltará a caminhar, com a aprovação de um plano de trabalho, este é o grande desafio que o Senado tem em mãos.
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