Bolsonaro cumprimenta Davi Alcolumbre, presidente do Senado, observado por Rodrigo Maia, presidente da Câmara: sem apoio deles, discussão sobre a prisão em segunda instância está travada no Congresso.| Foto: Marcos Corrêa/PR
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Ainda que aos trancos e barrancos, graças a tantas propostas diferentes e aos balões de ensaio da equipe econômica, a reforma tributária estava caminhando. Junto com ela, a reforma administrativa também tinha começado sua tramitação, com o envio da sua primeira parte, mesmo deixando de fora servidores da ativa e membros dos poderes. Depois de praticamente três trimestres em que as reformas foram vítimas da pandemia, da deterioração na relação entre governo, Congresso e Supremo, e de boa dose de hesitação e inatividade no Planalto – a reforma administrativa quase ficou para 2021 e só foi enviada por insistência dos parlamentares –, parecia que o trem das reformas e do ajuste fiscal estaria se movendo outra vez. Mas ainda há muitos meios de tirá-lo dos trilhos, e os obstáculos só parecem aumentar.

O auxílio aos mais vulneráveis no pós-pandemia, quando o governo voltar a ser obrigado a seguir as regras de responsabilidade fiscal, é tema importante, isso não se questiona. Mas o Renda Brasil e, posteriormente, o Renda Cidadã monopolizaram o debate e as atenções de todos os atores envolvidos, mostrando que falta uma definição clara de prioridades. Quando o novo programa social se torna praticamente o único assunto tanto de Executivo quanto de Legislativo, as autoridades estão simplesmente bailando ao som dos assuntos que geram mais repercussão no momento, quando na verdade deveriam ter diante de si um roteiro que contemplasse todos os temas e reformas relevantes – inclusive as maneiras de ajudar os mais pobres –, atribuindo a cada um deles sua real importância; a partir daí, a discussão política se daria levando em conta essa escala de prioridades.

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É preciso pensar em meios de auxiliar os mais vulneráveis neste momento. Mas, no médio e longo prazo, o que realmente vai permitir combater e vencer a pobreza é uma economia em ordem

E não há dúvidas de que a reforma tributária, para ficar naquela que já havia trilhado um caminho razoável dentro do Congresso, é um bem em si mesma. Apenas a simplificação dos tributos já representará um enorme alívio, especialmente para as empresas, hoje tolhidas por um arsenal quase incompreensível de normas tributárias que consomem tempo, pessoal e energia que seriam muito melhor empregados na atividade-fim de cada negócio. Dependendo da reforma que for feita, ela também terá outros efeitos altamente benéficos: a desoneração da folha de pagamentos terá efeito duradouro sobre o emprego, facilitando as contratações; se nosso sistema tributar menos o consumo e a produção, deslocando a ênfase para a tributação sobre patrimônio e renda, ajudará especialmente os mais pobres.

Mas até isso a discussão sobre o novo programa social chegou a travar, já que, dependendo dos meios que a equipe econômica encontrasse para financiar o Renda Brasil, seria preciso redesenhar as fases seguintes da reforma que Paulo Guedes queria enviar ao Congresso. Só quando Jair Bolsonaro, insatisfeito com as ideias apresentadas, encerrou a conversa sobre o Renda Brasil e transferiu a responsabilidade para o Congresso, que incluiu o Renda Cidadã na PEC Emergencial, os dois temas foram desvinculados – e mesmo assim a segunda fase da reforma tributária ainda não foi enviada.

O mercado já vem reagindo a essa mudança súbita nas prioridades de Brasília, com as reformas perdendo importância diante da discussão do novo programa social. Neste sentido, mais relevante que as oscilações diárias do dólar e da bolsa de valores é a disparada na curva de juros futuros. Ainda que a Selic esteja, atualmente, nos patamares mais baixos da série histórica, são os juros futuros que indicam a confiança do mercado na capacidade brasileira de honrar seus compromissos nos próximos anos. E esses juros, que já vinham subindo desde agosto, quando as pressões contra o teto de gastos aumentaram, deram um salto após o anúncio do Renda Cidadã financiado com Fundeb e precatórios, mostrando que os investidores já não enxergam em Brasília um compromisso tão firme com o ajuste das contas públicas.

Sim, é preciso pensar em meios de auxiliar os mais vulneráveis neste momento. Mas, no médio e longo prazo, o que realmente vai permitir combater e vencer a pobreza é uma economia em ordem. As reformas têm de recuperar a urgência que já chegaram a ter em alguns momentos, antes de serem eclipsadas por outros temas como vem ocorrendo agora; e, como as polêmicas não deixarão de existir, governo e Congresso precisam se comprometer com as reformas a ponto de não as deixarem em segundo plano novamente a cada bomba que explodir em Brasília. Sem essa definição clara de prioridades, será ainda mais difícil devolver o Brasil ao rumo certo.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]