As duas grandes reformas em tramitação no Congresso tiveram novidades nesta terça-feira. Enquanto a reforma administrativa superou um estágio importante de tramitação, a tributária continua sendo objeto de divergências públicas entre os presidentes da Câmara e do Senado a respeito do destino que deve ser dado ao trabalho da comissão mista que gastou meses na elaboração de um parecer.
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou, por 39 votos a 26, o parecer do deputado Darci de Matos (PSD-SC) pela admissibilidade da PEC da reforma administrativa, que consiste em uma “primeira fase” de mudanças constitucionais que redesenharão a estrutura do funcionalismo. A passagem pela CCJ não inclui ainda uma análise da proposta em si, mas apenas de sua conformidade à Constituição. O relator retirou algumas previsões do texto original enviado pelo governo: a permissão para que o presidente da República extinguisse, fundisse ou transformasse órgãos da administração pública por decreto; a proibição de que ocupantes de “cargos típicos de Estado” acumulassem outras ocupações remuneradas; e o acréscimo de mais oito princípios da administração pública – aos atuais princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, seriam somados imparcialidade, transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública e subsidiariedade.
Ainda que não apareça nominalmente na Carta Magna, a subsidiariedade e alguns outros princípios muito salutares, como a transparência e a inovação, precisam continuar a ser buscados na legislação infraconstitucional
É de se lamentar a oportunidade perdida de consagrar a subsidiariedade no texto constitucional brasileiro, pois este saudável princípio representaria uma mudança salutar na estrutura atual do Estado, em que tudo se faz de cima para baixo. Com a subsidiariedade aplicada à administração pública, ganhariam relevância aquelas estruturas mais próximas do cidadão, em vez das burocracias encasteladas nas capitais estaduais e federal. No entanto, ainda que não apareçam nominalmente na Carta Magna, a subsidiariedade e alguns outros princípios muito salutares, como a transparência e a inovação, precisam continuar a ser buscados na legislação infraconstitucional, como ocorreu com a MP da Liberdade Econômica, depois transformada em lei.
Enquanto a reforma administrativa, agora, vai para uma comissão especial, a última etapa antes das duas votações em plenário, a reforma tributária segue vítima da insistência do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em se portar como o dono da bola. Também nesta terça-feira, em evento do BTG Pactual, Lira afirmou que a reforma será fatiada, baseada no projeto do governo, e começa a tramitar na próxima semana. As afirmações desconsideram completamente o parecer da comissão especial mista, que preferiu uma reforma ampla e baseada na PEC 45, da Câmara, incorporando propostas da PEC 110, do Senado.
Falando no mesmo evento, depois de Lira, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), deixou claro o descompasso entre os dois ao defender uma reforma “completa e ampla”. No entanto, por mais que esteja certo, pois o fatiamento da reforma traz consigo uma série de problemas, Pacheco deve acabar mesmo vencido, já que no dia anterior, uma reunião entre dois chefes das casas legislativas e o ministro Paulo Guedes abordou a tramitação da reforma, e são grandes as chances de que Lira e o governo consigam o que desejam.
Ninguém deseja ver as reformas paradas, obviamente. Mas nem por isso a maneira como Lira vem forçando a condução da reforma tributária está isenta de críticas. Independentemente dos pontos positivos ou negativos de cada proposta em termos de impostos unificados, extintos ou criados, o modelo fatiado é inferior a uma reforma completa, em que todas as mudanças são colocadas na mesa de imediato e os parlamentares se debruçam sobre o mapa completo. Ainda mais preocupante é ver o fatiamento sendo imposto ao Congresso mesmo depois de uma comissão ter favorecido outra proposta. Que isso não impeça os parlamentares de endireitar o que precisar ser corrigido tanto na reforma tributária quanto nas demais reformas indispensáveis para o Brasil.