As instituições democráticas brasileiras saíram fortalecidas nesta quarta-feira, quando o Tribunal de Contas da União aprovou parecer recomendando ao Congresso Nacional que rejeite as contas de Dilma Rousseff referentes a 2014 – a primeira vez que algo assim acontece em 80 anos. A chicana montada pelo governo federal, que procurou de todas as maneiras adiar a sessão do TCU, não prosperou.
As primeiras derrotas do governo vieram no Supremo Tribunal Federal, onde a Advocacia-Geral da União havia feito dois pedidos: um, para que a apreciação das contas de Dilma fosse suspensa até o TCU analisar o pedido de afastamento do relator, ministro Augusto Nardes, acusado pela AGU de parcialidade e de ter antecipado seu voto em entrevistas à imprensa. O outro pedido era para que se pudesse ouvir testemunhas e colher provas do comportamento de Nardes antes de avaliar a primeira solicitação. O ministro Luiz Fux, a quem coube analisar o pedido da AGU, indeferiu o pedido de afastamento e nem achou necessário se pronunciar sobre a solicitação para se ouvir as testemunhas.
As evidências eram tão irrefutáveis que não foram necessários mais de 15 minutos para outros sete ministros do órgão acompanharem o relator
Sinal verde para que o TCU realizasse sua sessão. O ministro Raimundo Carreiro, corregedor do órgão, indeferiu pedidos para que fossem ouvidas testemunhas da suposta antecipação de voto de Nardes e foi enfático ao se posicionar pelo não afastamento do relator. Para ele, não havia “nada, absolutamente nada nas declarações que afigure juízo de valor”, e as afirmações de Nardes se referiam ao conteúdo de relatórios já concluídos. O corregedor ainda criticou o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, que teria incluído no pedido de afastamento recortes de jornais sem relação com o tema. “Ou o procurador não leu os anexos que juntou, ou juntou anexos sem relação ao objeto deste processo com pedido meramente procrastinatório”, disse Carreiro, que ainda falou da “peculiar criatividade processual” do advogado-geral. No fim, os ministros do TCU (com exceção do presidente, que não votou) foram unânimes em manter Nardes no processo.
Após oferecer um resumo de seu relatório – cuja versão completa já tinha sido enviada aos colegas – e explicar as irregularidades encontradas pelo corpo técnico do TCU nas contas de 2014 do governo federal, Nardes foi direto: “procedimentos afrontaram de forma significativa princípios objetivos preconizados pela Lei de Responsabilidade Fiscal, caracterizando um cenário de desgovernança fiscal”, referindo-se às “pedaladas” e outras irregularidades. As operações “distorceram a realidade financeira e orçamentária”. As evidências eram tão irrefutáveis que não foram necessários mais de 15 minutos para outros sete ministros do órgão, inclusive aqueles considerados mais próximos do governo, acompanharem o relator em seus votos (Cedraz, novamente, não precisou votar). Derrota do governo por unanimidade – mais uma vez.
O parecer, agora, será enviado ao Congresso, que pode aprová-lo (o que fortaleceria eventuais pedidos de impeachment por crime de responsabilidade) ou rejeitá-lo. O trabalho técnico dos integrantes do TCU dará lugar às negociatas com que Dilma vem tentando salvar sua pele, como bem demonstrou a reforma ministerial recentemente realizada. A presidente tem à disposição diversas maneiras de conquistar apoio dos parlamentares, mas pelo menos na noite de 7 de outubro de 2015 os brasileiros foram dormir confiando um pouco mais em suas instituições, que não se dobraram a pressões indevidas.
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