De todas as narrativas mentirosas que o petismo criou sobre a Lava Jato, uma que se tornou especialmente popular após a prisão do ex-presidente Lula é a de que a operação finalmente atingiu o objetivo que havia se proposto desde o início: pegar o ex-presidente e tirá-lo da disputa eleitoral de outubro. Daqui em diante, de acordo com essa versão, a Lava Jato vai murchar até terminar de vez, pois finalmente teria chegado a hora de “estancar a sangria”, na expressão do senador Romero Jucá, aquele que, em conversa com o então presidente da Transpetro, Sérgio Machado, disse que o “grande acordo nacional” teria de ser “com o Supremo, com tudo” – embora os petistas sempre omitam que, na conversa, o “acordão” desenhado pela dupla “protege o Lula, protege todo mundo”.
Presidentes e diretores das maiores empreiteiras do país, o ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, ex-deputados e senadores – são dezenas e dezenas de envolvidos que já foram condenados pelo juiz Sergio Moro; muitos já tiveram a condenação confirmada na segunda instância, embora alguns estejam em liberdade, como Dirceu, beneficiado por uma decisão bastante questionável da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal. Lula, assim, não é o primeiro figurão a parar atrás das grades na Lava Jato, mas é o principal. Isso significa que a operação cumpriu sua missão e a tendência seria seu arrefecimento? Os últimos acontecimentos mostram que não.
Procuradores, policiais e magistrados continuam trabalhando nos fios soltos, que não cessam de aparecer
A força-tarefa paulista da Lava Jato acabou de prender preventivamente Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, que é apontado como o operador de propinas de líderes do PSDB. As mesmas empreiteiras que abasteciam o propinoduto petista e de seus aliados na esfera federal teriam pago subornos na construção do Rodoanel, obra do governo estadual paulista. As investigações da Lava Jato também ajudaram a colocar no banco dos réus o advogado José Yunes e o coronel João Baptista de Lima Filho, amigos do presidente Michel Temer e apontados como integrantes do “quadrilhão do MDB”, formalmente denunciado no ano passado pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Portanto, a Lava Jato e seus desdobramentos parecem continuar a todo vapor, mas apenas quando não existe foro privilegiado envolvido. Pois o verdadeiro gargalo está na punição daqueles cujos processos correm no Supremo Tribunal Federal e dependem de investigação não das forças-tarefas locais, como as de Curitiba ou São Paulo, mas da Procuradoria-Geral da República. É sempre necessário lembrar que a Lava Jato já tem quatro anos, mas, das dezenas de políticos formalmente denunciados e que são detentores de mandato ou outro cargo que lhes confere prerrogativa de foro, apenas dez são réus no STF (incluindo Jucá e os senadores Gleisi Hoffmann e Fernando Collor) e nenhum foi julgado ainda. Recentemente, o STF arquivou dois inquéritos, contra Jucá e contra o senador tucano José Serra, por prescrição (no caso de Serra, devido à sua idade, o crime que estava sendo investigado já estava prescrito quando Janot pediu a abertura do inquérito).
As investigações sobre a pilhagem da Petrobras, o “crime inicial” que deu à Lava Jato seu alcance nacional, mostraram que o esquema era muito mais amplo: um conluio entre empreiteiras e líderes e partidos políticos que ocupavam os mais altos escalões do poder federal, e que nem de longe se limitou à maior empresa do país, envolvendo outras estatais, ministérios e obras administradas em âmbito estadual. Procuradores, policiais e magistrados continuam trabalhando nos fios soltos, que não cessam de aparecer. Se os gargalos forem resolvidos, especialmente no que diz respeito aos acusados com foro privilegiado, a condenação e a prisão de Lula podem até ser o ponto culminante da Lava Jato, mas não serão seu ponto final.