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editorial

Sergio Moro e o bem comum

 | NELSON ALMEIDAAFP
(Foto: NELSON ALMEIDAAFP)

Na primeira entrevista que concedeu a uma rede de televisão depois de eleito presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL) anunciou a intenção de convidar o juiz federal Sergio Moro, titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, para o cargo de Ministro da Justiça e de oferecer ao magistrado uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) quando a oportunidade surgisse. Na manhã de hoje (1º), Sergio Moro aceitou o convite. Em nota, o juiz diz tê-lo aceitado honrado e que tomou a decisão com “a perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado, com respeito a Constituição, a lei e aos direitos”. 

De acordo com o plano divulgado até o momento, a Pasta da Justiça voltará a comandar a Segurança Pública – retomando a supervisão da Polícia Federal – e aglutinará também a Transparência, a Controladoria-Geral da União e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), hoje ligado ao Ministério da Fazenda. Do ponto de vista institucional, Sergio Moro terá condições, se bem assessorado, de trabalhar pela integração e articulação de todos esses órgãos e comandar o combate não só à corrupção, mas ao crime organizado em todo o país. Na primeira entrevista que deu à televisão depois da confirmação de Moro, Bolsonaro afirmou que ele e o juiz concordaram “100% em tudo” e que o titular da pasta terá “ampla liberdade para escolher todos os que comporão seu segundo escalão”. 

Chama a atenção, na nota que o juiz federal divulgou, o trecho em que diz que, na prática, sua ida ao ministério “significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior”. Diante da magnitude do convite – que apesar disso lhe trará o custo de abandonar as garantias da magistratura –, Moro deixa claro que o avaliou à luz de sua eventual contribuição ao bem comum. Adotou a conduta que se espera dos homens públicos: avaliou as condições que o presidente eleito ofereceu a seu trabalho, ponderou suas condições pessoais de coordenar a pasta e concluiu que, de agora em diante, pode contribuir mais pelo país na pasta da Justiça e da Segurança Pública do que à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba. Tampouco se ignora que só a história poderá dar um veredito definitivo sobre essa escolha. 

É louvável que indivíduos que tenham dado uma contribuição robusta ao bem comum sejam convidados a ampliar sua capacidade de atuação

A despeito disso, já surgiram reações críticas à indicação de Sergio Moro que revelam duas visões que devem ser rechaçadas. De um lado, petistas e seus satélites veem-na como uma confirmação da narrativa esdrúxula de que a Lava Jato é parte de um “golpe” e que tirou o ex-presidente Lula da corrida presidencial para eleger Bolsonaro. Ainda que eventuais erros tenham sido cometidos no percurso, o que é inevitável diante da extensão do que estava em jogo, não se pode negar o legado extraordinário que Moro e a Lava Jata deixaram ao país. Há fartas provas da culpa de Lula – e de outros políticos, empresários e operadores –, colhidas e analisadas no pleno respeito ao devido processo legal. Além disso, para afastar qualquer questionamento sobre sua conduta, Moro anunciou seu afastamento imediato dos atos processuais. 

Lula não foi tirado da corrida eleitoral ilegalmente, mas em consequência da confirmação de sua condenação – por unanimidade – em segunda instância e da consequente aplicação da Lei da Ficha, sancionada por ele próprio com amplo apoio da base aliada. O argumento de que a conduta de Moro beneficiou Bolsonaro voluntariamente também não para em pé. Em 2014, quando a Lava Jato começou, e até recentemente, para muitos analistas, Bolsonaro não era sequer um candidato viável nas urnas. Tampouco é honesto se valer do fato de que Lula aparecia na frente nas pesquisas de opinião – ele nunca entrou na campanha e sua vitória não estava garantida, ao contrário do que querem fazer crer os agora derrotados. Uma retrospectiva torta dos últimos quatro anos é algo que só serve aos delírios petistas. 

É louvável que indivíduos que tenham dado uma contribuição robusta ao bem comum sejam convidados a ampliar sua capacidade de atuação. As dúvidas das pessoas de boa-fé diante de tal escolha estariam exatamente nesse ponto e nada indica que Sergio Moro não tenha sabido ponderá-las. O convite feito a ele, em pleno reconhecimento pela conduta exemplar e histórica nesses quatro anos de Lava Jato, é ainda mais positivo. No fundo, a reação negativa ao convite a Moro mascara uma profunda descrença na política, como se nenhum indivíduo pudesse ser sincero no cumprimento de seus deveres; e revela um forte cinismo sobre os seres humanos, como se toda vontade de contribuição ao bem comum tivesse de ser movida, mais ou menos superficialmente, por interesses escusos, mesquinhos e antirrepublicanos. 

Também se compreende que, diante da intensa propaganda petista nos últimos anos, muitos brasileiros tenham visto com receio Sergio Moro aceitar o convite para o ministério, como se isso enterrasse de vez a imagem de imparcialidade da Lava Jato. Por óbvio, isso não é assim, uma vez que a operação deve ser julgada por seus próprios – e fartos – méritos. Mas não é possível negar que há, hoje, pessoas de boa-fé com essa dúvida em mente. É preciso lembrar, nessa hora, que a narrativa do golpe e do partidarismo da operação não nasceu com esse convite. Verdade seja dita: mesmo se Moro não o aceitasse para preservar a imagem de neutralidade da operação, nada poderia ser dito, nenhuma prova mostrada e nenhum argumento esgrimido para que o petismo se convença do republicanismo da Lava Jato – o PT se mantém vivo alimentando essa negação. Não nos desviemos do essencial: este é o momento de todos os brasileiros acompanharem o trabalho do novo governo e torcerem pelo sucesso de Sergio Moro na função que se desenha.

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