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À medida que a vacinação vai avançando em vários países, eles começam a reabrir sua economia, levantar restrições e permitir o retorno da vida normal, deixando para trás o medo da Covid-19, ou ao menos o medo de um colapso das estruturas de saúde causado pela doença. É o que vem ocorrendo, por exemplo, em Israel, em vários estados norte-americanos e algumas nações europeias. O Brasil acaba de ter uma ideia de como seria essa retomada ao receber os resultados de um projeto do Instituto Butantan, realizado em Serrana, município do interior de São Paulo, na região de Ribeirão Preto, com cerca de 45 mil habitantes.
A cidade foi escolhida – talvez “contemplada” seja uma descrição melhor – para ter toda a sua população acima de 18 anos rapidamente imunizada com a Coronavac, fabricada pelo Butantan. É o que se convencionou chamar de “fase 4” das pesquisas com vacinas, em que se avalia o efeito da aplicação no público geral. Os resultados já haviam começado a aparecer antes mesmo de a aplicação da segunda dose estar concluída, em 11 de abril: àquela altura, a cidade já contava 13 dias sem intubações. Dias atrás, o Butantan publicou novos números: com o processo de vacinação concluído, os casos sintomáticos de Covid-19 caíram 80%; as internações foram reduzidas em 86%; e as mortes caíram 95%.
A retomada das atividades nos locais com boa cobertura vacinal beneficia não apenas a economia, mas também a saúde mental dos cidadãos, já que não existe nada de normal no dito “novo normal”
A pesquisa também concluiu que o nível de imunização necessário para conter o avanço da doença em Serrana foi de 75% da população adulta – quando se atingiu esse patamar, o ritmo de contaminação caiu mesmo nas áreas da cidade que ficaram por último no processo de vacinação. Além disso, também constatou-se que a imunização impediu que os moradores de Serrana, muitos dos quais trabalham em Ribeirão Preto, “importassem” a Covid da cidade vizinha, que vinha registrando alta no número de casos, criando o que o Butantan chamou de “cinturão sanitário” no município.
A evidência empírica obtida em Serrana se soma ao que vem sendo observado mundo afora nos locais em que parte substancial da população já foi vacinada. Mesmo antes de se chegar aos 75% de Serrana, ou de alguma outra porcentagem considerada suficiente para se alcançar a “imunidade de rebanho”, estes locais já começaram a retomar a convivência normal pré-pandemia, mantendo ou até relaxando parte das demais medidas preventivas. Este avanço beneficia não apenas a economia, como tanto vem insistindo o ministro Paulo Guedes, mas também a saúde mental dos cidadãos, já que, apesar da tão propalada expressão “novo normal”, não há nada de normal em ter de manter distância de pessoas queridas, em não poder estar junto com outras pessoas que compartilham dos mesmos interesses em um evento, show ou competição esportiva, ou em enxergar os todos os demais com desconfiança, como se fossem assassinos em potencial.
Outro município do interior paulista já está sendo alvo de pesquisa semelhante: em 17 de maio, foi iniciada a vacinação em massa de todos os adultos na cidade de Botucatu, três vezes maior que Serrana, com o objetivo de se medir a eficácia da vacina da Universidade de Oxford/AstraZeneca, produzida no Brasil pela Fiocruz. No lançamento do projeto, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, destacou a estratégia da cidade, que investiu pesadamente na testagem dos moradores – um quesito no qual, infelizmente, o Brasil como um todo deixou muito a desejar – e por isso só precisou adotar restrições mais fortes em duas ocasiões desde o início da pandemia. Que venham novos resultados positivos, deixando claro mesmo aos mais céticos que a vacinação é a arma definitiva que permitirá a vitória sobre a Covid-19.